SETÚBAL
O João, o Joãozinho como aqui era tratado, telefonou à Senhora, perguntando se arranjávamos um colchão para uma velhota sua vizinha, pois o dela, estava quase podre.
Como me alegra ver os gaiatos a carregar a aflição dos pobres!...
O João tem o seu emprego, a sua família, os encargos com a casa e também a dor dos pobres no seu coração.
Veio ele e o David Veia. Foram irmãos nesta Casa onde cresceram juntos, se fizeram homens e continuam a alimentar esta doce fraternidade.
O João veio da cidade com quatro irmãos quando a sua mãe vivia de esmolas. Nesse tempo eram as mães, que incapazes, nos vinham entregar os filhos!
O David trouxe com ele dois irmãos. Todos vivem dignamente e, agora, são contribuintes do Estado e não lhe dão problemas, mas lucros!
No caminho, os dois encontraram pertinho da nossa Casa, três colchões em bom estado. Pararam o carro do João, aproximaram-se do ecoponto do lixo a que eles estavam encostados e examinaram-nos. Estavam em boas condições. Só não tinham as medidas da sua protegida.
Vieram contar-me! Eu já os tinha avistado, de passagem, mas eles fizeram mais, analisaram-nos.
- Não quer que os vamos buscar?
- Esperemos pela noite -, respondi.
- Qual noite? Eu não tenho vergonha nenhuma, vou já buscá-los -, retorquiu o David.
Nem quinhentos metros andaram, trouxeram-nos e arrumaram-nos no salão de festas, que serve de armazém, ou, melhor, de entreposto de mobílias e outros bens destinados aos pobres.
Como os colchões eram de vizinhos que nada conhecem da Casa do Gaiato, estava com medo de magoar alguém e, por isso, lembrei-lhes a noite. Eles não - Vamos lá buscá-los sem medo e sem vergonha de ninguém.
São Gaiatos! Está tudo dito.
Depois, encontraram no entreposto, um bom à medida da cama "da sua Velhota".
Praia
O lar de férias na Arrábida está um luxo ou, melhor, um palácio de flores. A ampla esplanada coberta de buganvílias roxas e vermelhas dão à nossa casa um ar palaciano.
Os turistas nacionais e estrangeiros passam, olham e tiram fotos! Uma, duas, três e muitas vezes sem se cansarem de namorar e surpreender-se com tão rica combinação de flores.
Debaixo desta beleza os rapazes almoçam, jogam cartas e gozam a frescura nas horas de calor até irem para a praia. Não reflectem, mas inconscientemente esta maravilha tem o condão de os enriquecer e elevar!
Quais são as instituições que têm para oferecer aos seus protegidos maravilhas como as Casas do Gaiato dedicam aos seus rapazes?
Os meios de comunicação social, aliados à mentira, têm tido algum resultado e o Estado Português, por meio do seu ministério público, proibido que os órgãos oficias recorram à Casa do Gaiato para socorrer rapazes desamparados. A verdade é que não queremos ser uma casa de acolhimento temporário, mas uma família que esses órgãos poderiam aproveitar, para valerem a tantas crianças em risco neste distrito ou outros.
Mas isso não é connosco. Somos o que somos não damos encargos ao Estado, apenas queremos amar e fazer homens de rapazes sem família.
Padre Acílio