DA NOSSA VIDA

Insensibilidade

Em 1952, no 13 de Maio em Fátima, Pai Américo foi chamado, na hora da homilia, a dirigir a palavra à multidão reunida no Santuário. E anunciou a Boa Nova aos pobres, cheia de esperança para os caídos numa vida de pobreza involuntária, e de alento para os que não sabiam o que fazer e como fazer obras eficazes de misericórdia a favor do seu semelhante.

A partir desse momento um forte movimento nasceu, fazendo convergir vontades no sentido de dar remédio aos desprovidos de casa onde viver, em todas as partes de Portugal — o Património dos Pobres. De tal modo foi este original, que Pai Américo viu nele o Ovo de Colombo posto a descoberto para resolver o problema dos pobres sem casa, dando-lhes condições de vida dignas, adequadas à sua condição.

Até ao seu falecimento, em 1956, promoveu, ajudou e incentivou à construção de centenas de casas em todo o País, dedicando grande parte do seu tempo ao Património dos Pobres, deslocando-se a várias localidades a que o chamavam na hora de entregar a chave aos novos habitantes do Património, desde que estivesse garantida a simplicidade do acto, isento de vaidades que intrinsecamente se lhe opunham.

Foi no regresso de uma dessas viagens que o acidente, que o levou à morte, aconteceu.

Tal como o trigo que, lançado à terra, morre, e dessa morte nasce muito fruto, assim da sua irrompeu um enorme incremento no movimento de construção de casas para os pobres. Foram empresas e seus trabalhadores, paróquias, câmaras municipais, grupos de cidadãos, jornais, a promover a construção de casas e de bairros delas, tendo como animador espiritual e patrono Pai Américo, com o seu nome sempre a bailar na mente e nas palavras dos que faziam subir as construções aos milhares.

Com o passar dos anos, o estatuto destas casas, que as ligava à responsabilidade das paróquias, foi-se adaptando, atendendo às conveniências práticas da vida. Umas foram vendidas aos seus habitantes, quando anos depois melhoraram a sua situação, outras mantiveram-se segundo o estatuto inicial.

Chegados aos nossos dias, longe já dos tempos apoteóticos da sua construção, passaram a ser vistas pelos poderes públicos somente na perspectiva material, sem ter em conta a sua história e os seus habitantes.

O resultado foi que também estas casas passaram a ser, recentemente, tributadas pelo Fisco. Se as que são propriedade de particulares são tributadas, não causa qualquer surpresa; mas que aquelas que se mantêm na linha original o sejam, pelo IMI, já causa repugnância a todos aqueles que sabem distinguir o justo do injusto, sabendo-se que os habitantes destas casas usufruem delas sem pagamento de renda. O serviço que estas casas prestam aos pobres, que a Igreja continua a amparar arcando agora com as despesas do IMI, deveria justamente disso ser isento. A perda da memória é, também agora, uma grande pobreza.

Se nalgumas localidades possam já não ser necessárias pela baixa de população ou por outras razões, noutros lugares continuam a ser muito procuradas e a ser solução para quem não tem abrigo onde viver.

Padre Júlio