VINDE VER!
As grandes inquietações
Estes últimos meses, em nossa Casa do Gaiato de Benguela, o assunto do dia tem sido a Segurança Social. De tantas aflições que consomem as forças até a exaustão, desde o romper da aurora ao cair do véu escuro do anoitecer, veio juntar-se este enormíssimo problema ligado ao regime jurídico de vinculação, contribuição e regularização da dívida da Protecção Social Obrigatória. Chamo enormíssimo problema porque a Casa do Gaiato está a ser posta no mesmo conjunto de empresas que têm fins lucrativos pela produção que exercem no mercado angolano. Ora, isto está completamente errado. A natureza do objecto social da Casa do Gaiato não contempla qualquer lucro. É a solidariedade para com a criança abandonada nas ruas. Vivemos das dádivas que nos chegam vindas da generosidade das pessoas singulares. Se há alguma produção, é a favor do homem promovido a uma vida digna e, com isso, ganha o País, que é, de certa maneira, ajudado a tirar a criança da rua na condição triste de abandonada, que se lá permanecesse, seria a vergonha social de um País que quer figurar entre os estados promotores dos Direitos Humanos. Até nesta faceta, a Casa do Gaiato tem um papel importantíssimo na sociedade angolana. As exigências com a lei não devem ofuscar esta acção caritativa que já vai a caminho dos 60 anos por estas terras de Angola. As leis justas devem assentar nos princípios de Justiça e, neste sentido, não é justo dar o mesmo tratamento na resolução deste problema sem ter em conta a natureza e as circunstâncias de cada Instituição. A Casa do Gaiato é uma casa de família que acolhe os filhos que perderam a família biológica. É Obra de solidariedade. As empresas têm produção, lucro e riqueza. Nós temos a pobreza para enriquecer humanamente os filhos da rua, para que um dia possam ajudar esta sociedade a trilhar os caminhos da verdadeira paz e justiça social.
Na coluna do Vinde Ver!, de há dois números atrás, demos a conhecer a entrada de uma carta aos serviços Provinciais do Instituto Nacional de Segurança Social, dando a conhecer a natureza da nossa Casa, a sua acção social, a fim de encontrarmos consenso na resolução deste problema. Mas continuamos a ser alvo da mesma exigência que é dada às empresas com fins lucrativos quanto à dívida da Protecção Social Obrigatória. Temos todo o interesse em regularizar a situação dos nossos trabalhadores, que estão connosco mais por caridade do que propriamente para fins de produção. Para o pagamento dos seus ordenados dependemos das ajudas. E para o pagamento da dívida? E para quando o apoio mais comprometido dos órgãos do Estado de apoio à criança? Pela acção de solidariedade exercida em benefício das crianças angolanas carenciadas, não é hora para apoiar na continuidade de tão nobre causa, contrariamente às exigências impostas? Primamos pela dignidade das pessoas e queremos uma reforma digna para quem trabalhou, mas a Casa do Gaiato sozinha, neste momento de grande carência financeira, não tem capacidade para pagar dívidas e a reforma quanto ao retroactivo.
Esta é a nossa aflição, de momento. E se lhes contasse também aquelas que estão ligadas à vida dos rapazes, que são o nosso objecto principal de acção? A assistência e a educação da criança são a razão da nossa existência como Casa do Gaiato por estas paragens. Confiamos na Divina Providência em primeiro lugar, e depois nos homens fazedores de leis e, sobretudo, nos promotores da caridade para com os mais pobres do mundo, para que nos ajudem na resolução deste problema. Confiemos plenamente em Jesus que veio trocar-nos as voltas: «O meu Reino não é deste mundo; se o meu Reino fosse deste mundo, os meus súbditos teriam lutado para eu não cair nas mãos dos Judeus. Mas o meu Reino é diferente», Jo 18,36. A conclusão é de Pai Américo «Às vezes vem-me o tino; a inteligência das coisas terrenas. Nesta inteligência vejo os problemas de cada um: as idades inquietas, as tendências; E também o meu problema. O que então se passa na minha alma é coisa inenarrável. Entro a desfalecer. Mas isso dura pouco tempo. Deus tira-me o tino e dá-me a Sua loucura. Os problemas de todos, e o meu também, ficam num instante resolvidos. - Homem de pouca fé, porque duvidas?! Senhor de Misericórdia, Não retireis jamais da minha inteligência a loucura do Divino!»
Padre Quim