VINDE VER!

Viagem à Baía Farta

Pelo menos uma vez por mês impõe-se a necessidade de fazer por via terrestre uma deslocação até à zona pesqueira, ao longo da costa marítima de Benguela. O mar é um azul intenso e extensivo, qual manto molhado estendido pela mãe natureza a convidar seus filhos a contemplá-lo. O nome da Baía é Farta. Um dos Municípios bem conhecido pelos angolanos de Norte ao Sul e do mar ao Leste, pela abundância do pescado. É uma viagem de aproximadamente 35 quilómetros, numa das poucas estradas em bom estado de conservação. E o que vamos lá fazer? Um passeio? Não! Vamos trabalhar. A generosidade das pessoas vale muito. São gestos humanos que saciam a fome a estes pequeninos filhos que eram da rua e hoje são da Casa do Gaiato. Sempre encontramos muita simpatia, muito amor, transparecidos no acolhimento e boa vontade na resposta às aflições apresentadas. E todas as portas em que batemos quase sempre nos são favoráveis. Por volta do meio-dia, de regresso a Casa, com o coração agradecido pela pesca abundante para o mês, saltam os garotos para a carrinha para guardar as caixas na despensa. "De Rapazes, para Rapazes, pelos Rapazes", eis a nossa bandeira! Não há outra.

Ao entrar no escritório encontro outra lista enorme de compras, remédios para serem adquiridos na farmácia mais próxima, para dar aos trabalhadores e seus filhos doentes, para alguns dos nossos rapazes que se encontram na enfermaria. Outra grande lista de compras de material para as oficinas, outra para a cozinha. Os pobres à porta esperando por uma moeda nas suas mãos. Tudo por estas paragens pede e grita estendendo as mãos, suplicando socorro; sobretudo, as pessoas idosas e os doentes. A terra é fértil e generosa, a agricultura seria a porta de saída desta situação, mas, por vários motivos, continua adormecida à espera de um novo amanhecer produtivo. No nosso campo os viveiros de couve e repolho e alface já se mostraram vivos e em breve irão para os canteiros apropriados. A batata-doce e o milho também crescem à beira das mangueiras da avenida.

Outras tantas deslocações acontecem durante o dia! A ida às escolas onde estudam os nossos rapazes é um ponto de chegada frequente. Queremos saber a vida do Rapaz fora de Casa em ambiente escolar; seu comportamento, seu aproveitamento e tudo quanto se refere a ele. Outras vezes somos convocados de maneira obrigatória para responder pelos actos do Rapaz, para arranjar o uniforme e pagar a comparticipação. Uma, duas, três, tantas vezes! É a vida em família com os seus próprio desafios. A conclusão é de Pai Américo: «A nossa verdadeira fonte de receita é a justiça. Esta supõe a ordem. A ordem é pôr cada um no seu lugar. Dentro da Obra da Rua, o Farrapão é o primeiro.»

Padre Quim