PATRIMÓNIO DOS POBRES

Não é fácil nem barato arrancar uma família da extrema pobreza, quando não há parentes próximos, isto é, nem mãe, nem pai, nem avós, nem irmãos; ninguém de sangue chegado a si que lhe possa dar a mão. Mas ainda mais, quando é mãe sozinha com filhos! Se a pessoa não tem habilitações escolares ou formação profissional, as dificuldades aumentam.

Não chega dar uma casa, é necessário oferecer-lhes condições para vencer na vida.

Esta é a dificuldade de quem o Património comprou a última casa, de que ainda só paguei 18.000,00€ e falta-me, portanto, 17.000,00€.

Arranjou trabalho e a entidade patronal dar-lhe-ia mais 350,00€ se ela tivesse carta de condução automóvel. Então, que fazer se não lhe dar essa possibilidade pagando-lhe a carta?!...

Na Casa do Gaiato enquanto eu a construía e renovava, durante toda a vida, os Rapazes, além da preparação profissional e hábitos sérios de responsabilidade, todos tinham essa garantia: após os 18 anos, os que desejavam, iam para a Escola de Condução aprender a guiar o veículo automóvel a não ser que a sua capacidade intelectual ou a sua força de vontade falhasse. Todos, porém, experimentavam a sua aptidão para conduzir, com carta paga pela Casa do Gaiato de Setúbal.

Esta era também uma forma de os valorizar e lhes oferecer mais competências, para o seu futuro trabalho em qualquer empresa.

Agora com os mais pobres tento fazer o mesmo. Antigamente a escola que eu escolhia dava-me por ano uma carta gratuitamente. Com o Património dos Pobres, tenho tentado também fazer o mesmo.

Aquela mãe a quem dei uma casa para libertar a filha das garras da Segurança Social, vai também tirar a carta de condução, apesar do Património ter sido a sua segurança: foi necessário comprar uma cama larga, um colchão adaptado à sua saúde, uma cómoda para guardar as roupas, uma caminha para a menina, um frigorífico e uma máquina de lavar roupa, pois a menina tem de andar limpa e assídua na creche. Quanto à mãe, esta anda entusiasmada e focada no seu trabalho e na obtenção da carta de condução.

Esta mãe gastou tanto dinheiro ao Património para recuperar a própria saúde, não pode agora ficar desamparada e entregue somente a si própria, temos de continuar a dar-lhe a mão: para se alimentar enquanto não recebe o salário, para se deslocar para o emprego, para as consultas pediátricas da menina em Coimbra, quer ainda, para manter a sua casinha limpa, acolhedora e confortável.

O arranque da miséria extrema exige também que a gente se sinta familiar dos pobres e eles nos reconheçam como tal. Peçam ajudas, aceitem a repartição dos nossos bens como os filhos recebem o reforço dos pais, mesmo depois de casados ou juntos.

Ser família dos pobres é o melhor auxílio que lhe podemos dar, o mais forte conforto e encorajamento para vencer na vida. Instintivamente nos tratam por pais e os filhos por avós e assim nasce uma relação familiar que muitos os fortalece e anima.

A mãe da menina que partiu o queixo e foi tratada em Coimbra, numa clínica particular e que não aceita Vales do Estado porque o mesmo demora muito a reembolsar, voltou à consulta. Longe como é, as viagens são pesadas. Ao chegar à clínica fizeram exames médicos e verificaram que a mandíbula da criança não estava bem e com o crescimento do osso do queixo, poderia ficar defeituosa, era preciso ser novamente operada. Eu não tinha com que a ajudar.

A mãe telefonou de Coimbra à sua (recente) Entidade Patronal e esta informou-a do valor do seu trabalho e mandou-lhe por transferência 500,00€. A menina com 3 anos foi sujeita a nova cirurgia e a mãe a pagar mais 900,00€. Aonde é que ela tem esta quantia? Quando a ganhará? O Património é obrigado a ajudá-la, embora tenha gasto com a saúde da mãe, mais de 20.000,00€.

Os factos são claros e limpos; ninguém pode duvidar e quem dúvida!...

Padre Acílio

padre.acilio@gmail.com