PATRIMÓNIO DOS POBRES

A minha visita a Castelo Branco fui uma verdadeira vivência do Tempo Pascal.

A D. Fernanda tinha-me pedido: - Venha cá, porque tenho muita coisa boa para a Casa do Gaiato e para os vossos pobres.

Convidei para me acompanhar e conduzir a Sharan, o Carlos Inácio, mais conhecido entre nós pelo Gata. É um homem com cinquenta anos, empresário, com duas filhas, uma já com família constituída e outra nos seus quinze anos, o qual se disponibilizou para nos ajudar em tudo o que fosse preciso desde tratar dos porcos, passar um dia a fazer massa na betoneira, carregando-a a balde, até conduzir os veículos da Casa para qualquer serviço. É um homem de alma aberta a fazer o bem.

A nossa viagem foi um prazer para ambos, uma brincadeira contínua, o gozo de um para o outro, sempre com picadas e respostas de ambos os lados, acompanhados das respetivas galhofas.

Propôs-me seguir a estrada nacional para visitarmos vilas e aldeias da Beira Baixa, mas a preparação do veículo gastou-nos muito tempo e obrigou-nos a seguir a autoestrada.

Chegámos a Castelo Branco e esperava-nos a Salomé, amiga de há muitos anos, na estação da CP, conduzindo-nos a casa da D. Fernanda.

O encontro foi um matar de saudades, pois a pandemia tem-nos separado, aumentando assim o desejo de nos vermos.

Um almocinho apetitoso, preparado com todo o carinho e esmero, sentou-nos à mesa desta DELEGADA da Obra do Pai Américo, nesta cidade, encarregada por sua vontade e fé de recolher as esmolas boas daquela gente laboriosa e sã, onde permanecem activos os valores humanos e cristãos. Temos naquela cidade muitos amigos e amigas que rodeiam esta briosa benfeitora.

Trouxemos quinze garrafões de cinco litros de azeite, três tinas de enchidos, muita roupa nova e em bom estado e quatro mil e quinhentos euros certinhos.

O azeite colhido por cada família num trabalho duro é repartido com os pobres, como oblação oferecida ao SENHOR dos senhores quer em ação de graças quer em conforto dos corações feridos por aquilo que o Património dos Pobres lhes leva n'O Gaiato.

Duvido se todas as pessoas que nos deram o azeite ofereceram o que lhes sobrava ou deram também o que lhes fazia falta. Gente santa que vive o Evangelho sem rodeios.

* * *

Tem sido quase diária e vários dias, duas ou três vezes, os pedidos para pagar a renda das casas.

Durante a pandemia ninguém, por ordem governamental, podia ser despejado, mas agora, que as coisas começaram a aliviar, também os senhorios a coagir os inquilinos que lhes arranjem pelo menos dois meses.

Seria uma ajuda aos pobres que o Governo deveria dar desse dinheiro, oferecido pelos países mais ricos da Europa, às nações com menos recursos e não só aos empresários.

Quando ouço os políticos bem nutridos e enganosamente seguros nos seus ordenados - eles darão contas a Deus - a falar da luta contra a pobreza, vou dizer o que não devia, apetece-me partir o ecrã dos noticiários ou atirar com o pequeno rádio contra a parede!...

Não têm vergonha!... Que Deus lhes perdoe, pois não sabem nem o que dizem nem o que fazem.

Entre as pedintes, apareceu-me uma mulher com duas crianças, uma menina de colo e outra já a correr. A mãe, com vinte e sete anos, já deu à luz cinco filhos e não é cigana. O progenitor foi para casa da sua mãe, não quer trabalhar nem saber dos filhos nem da mulher que lhos gerou.

Apareceu sem uma carta do pároco ou qualquer recomendação de alguém. Veio a chorar que nem uma madalena, que a senhora é obrigada a pagar dois meses ou a punha na rua.

Ouvia e lamentei com ela: - Agora com vinte e sete anos é que tinhas capacidade para escolher o homem da tua vida - ao que ela retorquiu: - Pois é, mas a gente não pensa.

- Agora ficas tu e eu com o encargo dos vossos filhos.

A organização social, na prática, com estes casos e outros parecidos, tem uma grande responsabilidade!

Ai do mundo se não brilhasse a CARIDADE CRISTÃ e a MISERICÓRDIA DIVINA.

Quem vai agora obrigar um jovem daqueles a trabalhar? Quem? Quem irá amparar esta mãe que começou a criar filhos, adolescente? Quem vai agir rapidamente (as crianças precisam de fraldas, alimentos e outros cuidados diariamente)? Não é só daqui a quatro ou cinco meses, como faz a burocracia!

Mais não escrevo hoje.

Padre Acílio