PATRIMÓNIO DOS POBRES

Ontem, ao cair da tarde, senti-me triste, ia a dizer, revoltado, por causa de um telefonema de uma pobre doente que me pedia o pagamento da renda da cave, onde se encontra na cama.

- Oh! senhora, dirija-se ao seu pároco, que ele o atenderá, pois é o seu pastor, já que é uma mulher de prática cristã.

Sim, os párocos devem ser pastores no sentido da Sagrada Escritura e nas encíclicas dos últimos Papas, e não apenas administradores e directores.

O pastor é aquele que se dói das suas ovelhas e busca sempre as mais tresmalhadas, até as encontrar. Era assim a pregação de Jesus. Eu não conheço outra. Que me perdoem os letrados e doutores e ninguém me leve a mal.

Esta cave situa-se num dos bairros ricos da cidade. A pobre doente é católica, vai à missa quando a doença o permite.

Havia telefonado ao seu pároco a pedir e a lamentar a sua penúria mais a incapacidade de cumprir a obrigação para com o senhorio. Implorou quanto pôde. E a resposta foi sempre a mesma:

- Não tenho verba. - Detesto a palavra verba na boca de um sacerdote. É demasiadamente profana, própria dos administradores, banqueiros e políticos. Eles é que falam assim: não temos verba. Esta palavra significa uma quantia destinada para determinado fim. Neste caso, o fim seriam os pobres.

Mas, se não tem, dê do seu. Tire do seu mealheiro, carteira ou conta bancária e não tenha medo porque, como diz o povo e confirma a minha experiência, quem dá aos pobres empresta a Deus. Olhe que o povo tem razão. Deus não é caloteiro. Paga sempre a dobrar. Quem experimenta esta doutrina verifica que é verdadeira.

Dê padre, dê do seu dinheiro. O valor é insignificante... 180€. E na próxima celebração em que tiver a igreja cheia, como é costume, pregue esta pobre e refira a sua ousadia de ter dado do seu próprio dinheiro. Dê, padre, dê. Não hesite. Se não acredita, faça a experiência, mas não responda desta maneira a nenhum dos seus pobres.

Não reza no breviário aquele salmo tão bonito: "A minha alma tem sede Deus, do Deus Vivo; quando irei contemplar a sua face?" Olhe que a face do Deus Vivo está naquela cave tão real e perfeitamente como no sacrário. Ele, que é o grande Pastor, desabafou uma vez que não tinha onde repousar a cabeça e os discípulos, apavorados, com uma numerosa e faminta multidão, receberam d'Ele esta ordem: "Dai-lhes vós de comer". Este é o maior mal da Igreja entre nós: a falta de Fé. Aparecem, assim, respostas destas que são facílimas de dar.

O Papa Francisco, na sua primeira exortação pelo 1.º Dia Mundial dos Pobres, recomenda aos irmãos Bispos, aos sacerdotes e diáconos que, "por vocação, têm a missão de apoiar os pobres, para que neste Dia Mundial dos Pobres, se comprometam a instaurar uma tradição que seja um contributo concreto para a evangelização do mundo contemporâneo". E continua: "Não esqueçamos que para os discípulos de Cristo a pobreza é, antes de tudo, uma vocação a seguir Jesus Pobre e um caminhar atrás d'Ele e com Ele, o caminho que conduz à bem-aventurança do Reino dos Céus. Não esqueçamos que o Pai Nosso é a oração dos pobres. De facto, o pedido do pão exprime o abandono a Deus nas necessidades primárias da vida. Tudo o que Jesus nos ensinou está nesta Oração. Exprime e recolhe o grito de quem sofre pela precariedade da existência e a falta do necessário."

Vossa Reverência não vive em nenhuma cave, pois não? Olhe que se isto lhe acontecesse teria, com certeza, com que ajudar a pobre da sua paróquia, e mais, adquiriria autoridade para desinstalar homens, mulheres e famílias a converterem-se ao Evangelho de Jesus Cristo.

O Papa Francisco continua: "Se viverem no vosso bairro pobres que busquem protecção e ajuda, aproximemo-nos deles: será o momento propício para encontrar o Deus que buscamos".

Padre Acílio