PATRIMÓNIO DOS POBRES
Está comigo, nesta Casa de Setúbal, o nosso P. Rafael.
Veio para ser uma presença paternal nos tempos em que eu estivesse ausente, por causa da operação à anca. Como esta foi adiada e eu ainda não sei quando se realizará, ele permanece comigo e tem-me proporcionado uma convivência muito agradável pela sua posição humilde e alegre e pelo testemunho vivo da sua entrega aos pobres.
O meu companheiro actual nasceu em Saragoça, Espanha e a sua vida enquanto sacerdote, foi dedicada aos mais pobres - Pobreza de bens, de instrução, cultura hábitos de trabalho, higiene e convivência. Não contente com este chamamento fez-se missionário e encontrou-se connosco no centro de Angola, onde a pobreza dos Padres da Rua o encantou e atraiu.
Há treze anos que carrega a Casa do Gaiato de Malanje e, no seu serviço, teve um acidente rodoviário gravíssimo quando se dirigia de Luanda para Malanje. Partiu vários ossos das pernas e o tornozelo do pé esquerdo ficou todo partido. Veio para Portugal onde, no Porto, foi operado e ainda continua com os ossos dum artelho ligados por ferros. Terá consulta somente no final de Agosto para ver se lhe poderão tirar os referidos ferros e caminhar normalmente. Está ansioso por se sentir no meio dos seus rapazes e comungar das carências daquela gente.
Malanje fica no centro de Angola, alinhando para leste numa distância da Capital superior a 400 quilómetros. Foi uma cidade forte em tempos passados, quer na indústria quer na agricultura. Hoje é uma pequena aldeia onde se juntou muita gente deslocada pela guerra e pelas dificuldades próprias do mato.
Dizia-me, há dias, que em cada dez pessoas, sete vivem abaixo do limiar da pobreza. Só por estes dados verificamos como está difícil morar naquela região angolana e, mais ainda, sustentar e preparar para a vida mais de uma centena de rapazes.
Foi a pobreza dos Padres da Rua que o cativou, foi o mesmo Espírito que acorrenta e alicia os outros padres. Aqui devo perguntar porque é que o mesmo Espírito não atrai outros sacerdotes ao mesmo ideal? Porquê meu Deus!?
O P. Rafael é missionário sem pertencer a qualquer congregação, instituto ou ordem. É pobre no meio dos pobres onde esses são explorados e como ele, de bico tapado pelo medo.
Poder-se-ia pensar que a pobreza daquela gente se combateria com riqueza mas isso é engano do mundo!... A melhor forma de aliviar a situação social daquele povo é a Justiça. Mas quem promove esta virtude fundamental de qualquer situação e mais ainda daquele povo? Sim, quem a promove? Todos que a deviam accionar calam-se como cães mudos e escolhem outro caminho mais adequado ao pensar e sentir do mundo o qual tem como DEUS o dinheiro com os seus atributos de poder, influencia e domínio humano.
A única maneira de viver é unir-se ao povo, vítima do esquecimento, da ignorância, da exploração e viver com ele.
É necessário uma coragem inaudita para assumir esta virtude com os pobres desta maneira, a qual é a única possível. Assim o fizeram os padres Carlos de Foucauld, Damião, dos Leprosos, e quantos no escondimento e desprezo humano se deram e continuam a imolar ao CRUCIFICADO ACTUAL nos pobres e com os pobres.
Padre Acílio