PATRIMÓNIO DOS POBRES
Alegrou-me que uma leitora Amiga me telefonasse, há dias, dizendo que me marcou falta.
É uma forma de manifestar o seu carinho e o seu empenhamento.
Dei-lhe razão pelo facto de não ter escrito o Património dos Pobres, mas não faltei com a minha colaboração n'O Gaiato. Vi neste telefonema apenas o carinho que o Património dos Pobres lhe merece.
São os Pobres quem mais dói à consciência bem formada dos cristãos.
Há muita gente a comungar comigo pelas mesmas aflições e idênticos repulsos, a colaborar com o que pode e está ao alcance de sua economia familiar ou pessoal.
Deixei de publicar tim-tim-por-tim-tim os auxílios que me são enviados por me parecer que estava a ser explorado por alguém (espertinho?) que apertava comigo como se o Património dos Pobres devesse, materialmente, alguma coisa a alguém.
A gente dá como pode e como entende as necessidades particulares de cada pessoa ou família e não aos choros ou ameaças. Fazemos jogo limpo. Aqui não há preferências. Os mais pobres são os mais favoritos.
Como não posso sair de Casa, pelas circunstâncias conhecidas e pelas dificuldades pessoais de andar, não tenho ido aos Pobres e estes não têm vindo livremente a nossa Casa, para preservarmos a saúde dos nossos 40 rapazes.
Não cortámos radicalmente com os Pobres, mas um dos mais velhos da Casa, fez um cartaz e pô-lo à entrada: Proibido o acesso a estranhos.
Dada a conjuntura das aulas à distância, obriga-me a um trabalho redobrado, embora tenha a preciosa ajuda do Danilo, sinto, por vezes, que não sou capaz de dar o que quero e é preciso. Agora, estou mais com os pobres dos meus filhos do que com os filhos dos outros.
O ensino à distância tem a vantagem de podermos ter acesso ao conhecimento, numa altura destas, mais não podemos, nem devemos deixar sós os rapazes, e muito menos as crianças, com os computadores e a televisão.
É preciso acompanhar, explicando, de forma adaptada à capacidade de cada um, os conteúdos que nos são apresentados, vigiar para que não pegue a brincadeira ao invés da atenção, e estimular com a presença e ajuda cada um dos rapazes ou crianças, etc., etc.. Isto obriga-me a um esforço que já não é para as minhas forças.
No meu, de tanto reboliço conforta-me especialmente o acompanhamento, ao longe, de dois Sacerdotes amigos - um da minha Diocese de Coimbra e outro da Capital que fez, outrora, nesta Cidade de Setúbal a sua missão, quando pertencíamos ao Patriarcado.
Tanto um como o outro foram professores e agora repartem connosco as suas reformas e fizeram-nos seus herdeiros. Ambos venderam algum do seu património e o dinheiro veio direitinho para esta Casa do Gaiato. Lembra-me o fogo que ardia na alma dos primeiros cristãos e os fazia vender o que possuíam pondo o seu valor aos pés dos apóstolos.
Padres com Alma ainda hoje há e estes são luz e inquietação, neste tempo pascal tão atribulado.
Poderiam passear, envolver-se em peregrinações, conhecer o mundo, aumentar a sua cultura!... Poderiam!... Mas preferem renunciar a tudo isso que passa e agarraram-se de alma e coração aos pobres.
Benditos padres! Estes acreditam na Ressurreição e mostram-no em obras e desprendimento. O P. Américo gostava com expressão própria do seu lindíssimo português de gritar: Ai que se fossemos todos da nova lei os montes arrasavam-se, os vales preenchiam-se e o Reino de Deus alargava-se!
Padre Acílio