PATRIMÓNIO DOS POBRES
Ando com medo. Vejo a pobreza a aumentar, sobretudo a extrema.
Quando, na última propaganda eleitoral, ouvi, pela boca do líder de certo partido, que iria acabar com a extrema pobreza, disse para os meus botões: «Esta gente não sabe o que é pobreza, muito menos a extrema pobreza». Referir-se-ia aos que dormem na rua? Pelo que me toca, vejo a pobreza a aumentar e a crescer, nem que melhorem os ordenados e as pensões. A vida dos mais pobres é cada vez mais difícil, vivem à deriva, sem alguém que lhes dê a mão.
É o caso daquela mulher forte que veio ter comigo muito aflita. Mora na Fonte Fresca, num bairro social situado logo a seguir ao supermercado falido da cooperativa.
O motivo que a trazia era uma divida às finanças. «Tivemos um carrito velho, vendêmo-lo a uma pessoa que o comprou e não o registou em seu nome nem deu baixa», falava no plural pois era ela e seu marido que agora está preso.
Às finanças não escapa nada, a multa foi crescendo, os valores aumentando de tal forma que o montante chegava agora aos 2.000,00€.
A pobre, sozinha, com cinco filhos, todos menores, e um, de sete anos, com uma deficiência congénita, de ter a uretra ligada ao ânus e por isso obrigado a usar fraldas, veio aqui - não só aos alimentos, à roupa e ao calçado -, mas, também, com um papel das finanças para eu lhe valer e ela poder pagar prestações de 106€ mês, sendo necessário entrar com 1.000,00€.
Fiquei a olhar para as paredes e perturbado. Tudo me parecia escuro.
Com pena, a Câmara cedeu-lhe uma casa no referido bairro. Não sei quem pôs o problema à Edilidade. Deve ter sido alguma Assistente Mulher não somente funcionária.
Mas como aliviar essa pobre desgraçada, vítima dos maus tratos do marido que, por isso, apanhou dez anos de cadeia?!
Vê-se agora com um Estado totalitário (é como eu vejo a acção dos órgãos do Estado sobre os Pobres que me passam pela mão), sobre quem não tem defesa e se encontra rodeada de encargos. Olhar para ela, é sentir a fome de quem só come pão, daí a sua aparência física.
Eu não sou nada. Apenas uma voz que clama a Justiça, mas... não haverá alguém que faça uma exposição ao Sr. Ministro das Finanças a pedir clemência para esta desditosa mãe? Não haverá? Nem na Segurança Social, nem noutros gabinetes do Governo?
Ela bateu a todas as portas e só ouviu, infelizmente, a palavra - não!
Que fazer? Dei-lhe, em cheque dirigido a um Instituto, não me lembro do resto, de 1.000,00€, para ela poder livrar-se do pesadelo.
É triste que uma mulher assim tratada não tenha qualquer fuga diante do Estado!
À sociedade ela deu, pelo menos, cinco filhos, os quais, amanhã, serão contribuintes. Para continuar a cumprir o compromisso assumido de pagar ao Estado mensalmente 106€, terá de os arrancar à sua boca e às necessidades mais urgentes dos seus filhos.
Padre Acílio