PATRIMÓNIO DOS POBRES
Entre as tragédias que me bateram à porta, nesta quinzena, devo salientar a que me trouxe um pai de família, abandonado pela mulher e com dois filhos a seu cargo: Uma, de doze anos e, outro, de oito.
Acabava de almoçar, à pressa, e preparava-me para sair, quando o Hélio me vem dizer: - Estão ali duas pessoas que desejam falar-lhe.
- Não posso. Já devia estar na fisioterapia, onde chego sempre atrasado, e o terapeuta não gosta. Diz isso mesmo às pessoas.
O rapaz vem com outra sugestão: - Se lhes dava oportunidade de uma palavrinha.
- Diz-lhes que não posso.
O senhor foi-se embora e voltou pelas seis da tarde, acompanhado da mesma senhora.
Foi esta que começou o diálogo: - Vimos ter consigo para pedir uma ajuda. A mulher deste senhor - e olhava para o homem -, saiu de casa, não se sabe dela e deixou-o cheio de dívidas. Agora, as finanças vieram para cima dele, penhoraram-lhe o ordenado e ele fica apenas com 500 euros para se governar, pagar renda de casa e alimentar-se, a ele e aos filhos. Tenho-o ajudado, mas não posso mais. Ele deve cinco meses de renda de casa e a senhoria pretende pô-lo na rua.
Nessa altura o homem começou a chorar!
Se as lágrimas de uma mulher mexem comigo, muito mais as de um homem. Figura alta, magrinha, chora irresistivelmente: - Desgraçou-me a vida! - disse, no meio de soluços. - Deixou-me empenhado em mais de cinquenta mil euros.
Perguntei e ele disse-me onde trabalha, com um ordenado a passar os 700 euros. - Fico só com quinhentos. Trezentos para a renda de casa, veja quanto resta para as despesas. Já fui à Segurança Social, mas nada. Terei que esperar que os tribunais abram das férias.
É pena que uma Sociedade permita todos os desmandos e não tenha capacidade de remediar, logo que surjam, e deixe tudo ao deus-dará, como se não fosse responsável por tanta indisciplina! Uma mãe deixar a casa, os filhos que gerou, não cometerá crime? Se é, porque não é procurada e trazida à responsabilidade?!...
Oh! mundo, cada vez mais cego e mais desumano, onde chegas?! Será isto liberdade? Encher a família de dívidas, desprezar os filhos e trair o marido? E tu, oh! mundo cada vez mais louco, bates palmas à bebedeira das paixões e lavas as mãos, como Pilatos, numa cobardia assustadora!
Imitas tudo que é mal nas outras nações, mas não reparas no modo como elas resolvem os problemas. Enches os escaparates com revistas destes exemplos de gente grande e não olhas para os resultados consequentes da ignorante, estulta miséria com espírito de rico, que deseja imitar os famosos, vazios de valores.
Esta é, também, uma questão política e aqueles que nos governam devem sentir o dever de prevenir situações semelhantes.
Não é só legislar, para atrair clientela, à custa de pisar os valores do Homem!
Há muito que eu peço uma pessoa séria em cada centro da Segurança Social, que tenha capacidade financeira para acudir, na hora, a casos destes.
Os dias passam e as horas também! Surge a falta de higiene, da luz e do gás, os meses passam, com o dia 8 à porta, as rendas a acumularem-se e o sofrimento de quem deve.
Enquanto o senhor Ministro da Segurança Social não me ouve, vamos clamando, gemendo e chorando à espera que alguém tenha ouvidos para ouvir, como é o seu dever.
Se o dinheiro sai para um problema familiar, esse investimento facilmente se documenta com o nome da pessoa, a sua morada, B. I. e nº de contribuinte!
Tudo fácil!... Falta apenas vontade de quem não passa por estas dores.
A Obra da Rua faz o seu papel: remedeia à custa da Caridade cristã e denuncia como é o seu dever.
Padre Acílio