PATRIMÓNIO DOS POBRES

Património continua o seu caminho pelos pobres.

Os futuros habitantes daquele andar destruído, de que falei aos nossos leitores, continuam em expectativa.

Já levei ao lugar o senhor que trabalha os alumínios e as coisas estão bem encaminhadas, por ser uma pessoa séria, cujas provas foram dadas a trabalhar para nós, com uma experiência que resultou em confiança.

Passei uma quinzena à procura de um outro, que me fazia os trabalhos para os pobres, sem grandes incómodos da minha parte. Ia com ele à casas das pessoas. O senhor tirava as medidas, executava o serviço, dizia-me quanto tinha a pagar e eu cumpria, sabendo que ele não explorava ninguém. Tinha o seu número de telemóvel. Tentei muitas vezes, mas ele não respondeu.

Procurei outro e encontrei-me com ele, verificando que nos conhecíamos.

Com a crise na construção civil, as pessoas mais habilitadas emigraram e, hoje, torna-se difícil encontrar artistas capazes e sérios.

Vamos andando. Dentro de pouco tempo darei notícias.

Os futuros inquilinos têm um canalizador amigo que lhes instala uma nova canalização. Hoje mesmo comprei o material e lho entreguei para que o beneficiário, com a sua esposa, faça os roços, adiantando o serviço ao canalizador. Gosto muito de pôr os utentes a participar no arranjo das próprias casas.

— Você ponha um boné na cabeça para se proteger e com um escopo e uma maceta vá cortado o chão e as paredes para o canalizador estender a tubagem no chão e a erguer pelas paredes até à altura marcada.

— Ó, senhor padre, eu não posso pôr nada na cabeça porque ela tem que respirar.

Nisto levantou as calças e mostrou-me as pernas cheias de manchas e borbulhas em zonas que pareciam desenhadas, em coração. Olha-me e diz: — Vê como tenho a pele. — Arrepiei-me, porque também eu sofro da pele.

— Às vezes, quando posso, compro uma pomada e isto alivia, mas quando não tenho dinheiro, não calcula como sofro!

Os males da pele são dolorosos, provocam comichões terríveis e quanto mais coçamos, tentando aliviar, mais agressivos se transformam. Vale-me o champô caro que de vez em quando vem do Jumbo com embalagem estragada e loções de bebés com que cubro o corpo, após o banho.

Ao surpreender-me com as manchas em borbulhas vermelhas disseminadas pelas pernas e ao dizer-me que tem assim o corpo todo e não pode pôr um boné na cabeça, horrorizei-me com o sofrimento deste pobre.

Alguém me irá dar uma mobília completa. Ele já tem material para pôr o chão. Depois da casa arranjada, como seria bom que eu carregasse os móveis dessa casa, em directo para morada desta gente. Não andaríamos a armazenar mobílias na Casa do Gaiato.

Encontrei também uma pobre viúva com a sua moradia assaltada pelo telhado. Os ladrões partiram as chapas de lusalite em dois lados, fizeram dois largos rombos e entraram, assim, para realizar o assalto.

Toda a água do telhado caía em casa. Estava tudo encharcado, móveis, sofás, camas, roupas. Era um dó!

«Se eu lhe valia que ela não era capaz.» Ainda ralhei: — Então você tem isto assim desde o Verão e, só agora, neste temporal, vem pedir auxílio?!

Os pobres são assim. Aguentam até à última!

Pus-lhe lá quatro chapas de telha sanduíche, com onze metros de cumprimento e um de largo.

Não sei onde dorme. É capaz passar a noite na casa da irmã. Ainda não as tinha colocadas. Espera ajuda de uns vizinhos que trabalham nas obras, mas manifestava-se tão contente que saltava de júbilo diante de mim.

Padre Acílio