PÃO DE VIDA

Da Missa Nova do Padre Américo em Coimbra

Em 29 de Julho de 1929, no dia seguinte à sua ordenação presbiteral, pelo Bispo de Coimbra, D. Manuel Luís Coelho da Silva, o Padre Américo Monteiro de Aguiar celebrou a sua Missa de início de ministério presbiteral - primeira Missa Nova - na Capela das Irmãs Coadjutoras [de Jesus, Maria e José], assistido pelo Cónego Manuel Fernandes Nogueira. Esta Pia União de Irmãs foi instituída pelo mesmo Bispo, em 19 de Abril de 1927; e serviram no Seminário de Coimbra até 1933.

O Padre António Moreira da Rocha, penafidelense e seu amigo próximo, deixou um interessante artigo na revista Penafiel [1972], intitulado "Memorial - Dois Eclesiásticos", do qual respigámos alguns nacos narrativos, para ilustrar estes seus dois dias muito felizes! Tem pormenores circunstanciais e é um testemunho biográfico precioso, a que vale a pena dar atenção com sentimentos de gratidão e admiração. Então, sobre esses acontecimentos sacerdotais importantes, transcrevemos uma interessante crónica. Eis: No último sábado de Julho de 1929, vindo do Porto, no rápido da tarde, cheguei a Coimbra com o P.e José Monteiro de Aguiar, que procedente de Cucujães [onde era professor do Seminário das Missões] me fez óptima companhia desde Espinho. Na Estação Nova encontrava-se à nossa espera o P.e Américo [Américo Monteiro de Aguiar]. De lá seguimos para o Seminário [de Coimbra], onde fiquei instalado, por amável deferência do Reitor [Vice-Reitor], o Il.mo Cónego Tomás Fernandes Pinto.

No domingo [28 de Julho de 1929], realizou-se a ordenação de presbítero do P.e Américo. Efectuou-se na capela privativa do Bispo de Coimbra [de Nossa Senhora da Anunciação], que tinha então a sua residência no Seminário. A ministrar, D. Manuel Luís Coelho da Silva, havia vários ordinandos. Presentes os superiores da Casa, alguns seminaristas e número restrito de pessoas da família dos que seriam ordenados. Do concelho de Penafiel, o Celebrante, o irmão P.e José, e o autor destas linhas, também estava. Por muitas razões, aquele acto solene foi para mim muito impressionante. A beleza do cerimonial litúrgico e a pessoa do Ministro da ordenação - figura aureolada pela fama de muita virtude e saber - não podiam deixar de me infundir extraordinários sentimentos de admiração e respeito. Tudo isso não lograva dissipar em mim um certo estado emocional resultante de ver realizar-se naquela hora o que havia sido o maior sonho, a suprema aspiração de alguém que recebia das mãos do Bispo a sagrada ordem de presbítero.

Na manhã do dia seguinte [29 de Julho], o neo-presbítero Américo celebrava a primeira-missa. Não foi na igreja do Seminário, mas sim numa capela interna, em nível inferior a ela, existente na parte mais baixa do edifício. Lá se encontravam vários padres, alguns companheiros mais amigos e dois ou três íntimos estranhos à Casa. Raramente na minha vida presenciei acto litúrgico que me parecesse impregnado de tanta sobrenaturalidade.

O próprio recolhimento do lugar, interioridade do novo sacerdote, bem transparente em todas as suas atitudes e gestos, a formosura das palavras proferidas e a elevação da música sacra que se ouvira - tudo se conjugava para dar àquele ambiente tão singular clima espiritual.

Ao órgão, o P.e Dr. Elias Aguiar - distinto director do Orfeão Académico de Coimbra e professor de Hist. da Música, na Fac. de Letras durante muitos anos - a quem o P.e Américo tinha pedido música sugerida apenas pela inspiração de momento.

Seguiu-se depois frugal almoço no refeitório do Seminário. No momento apropriado, o P.e José Monteiro de Aguiar disse palavras de muito agradecimento, dirigidas ao Sr. Bispo e superiores da Casa, pelo bom acolhimento dado a seu irmão; o Cónego Tomás não se cansou de exaltar como muito abençoada a hora em que o Américo entrou para aquele Seminário [em 3 de Outubro de 1925, com 38 anos]; por último, o neo-presbítero declarou a sua imensa gratidão a todos quantos colaboraram para a felicidade que ora sentia, a par de uma ânsia de trabalhar sem medida no campo do Apostolado. Foi então que lhe ouvi a curiosa expressão: "já não tenho tempo de perder mais tempo!".

Como havia programado, ao fim de alguns dias, pusemo-nos a caminho de Paço de Sousa, onde o P.e Américo celebrou a segunda-primeira Missa. Tudo correu como previsto. De Paço de Sousa, para S. Miguel de Paredes [em Penafiel], a passar os tais "dois mesitos".

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Como homenagem muito justa, registamos ligeiras notas biográficas sobre três ilustres sacerdotes, participantes desses momentos significativos e amigos do Padre Américo, registados acima, avivando assim a sua grata e feliz memória eclesial.

O Padre Manuel Fernandes Nogueira nasceu em 7 de Abril de 1861, na vila de Loriga, concelho de Seia, então da diocese de Coimbra [até 1882]. Frequentou o Curso Teológico, no Seminário de Coimbra [1880 a 1883]; e foi ordenado Presbítero em 19 de Outubro de 1884, pelo Bispo de Coimbra, D. Manuel Correia Bastos Pina, na igreja de S. João de Almeida, do então Paço Episcopal. Pároco encomendado [12-XII-1884] e colado [14-VI-1907] do Piódão, concelho de Arganil. Nessa povoação fundou um bom centro de estudos [colégio], que funcionou entre 1886 e 1906. Veio para o Seminário de Coimbra em 1907, pela mão do Vice-Reitor Cónego José Alves Matoso, e aí foi Director Espiritual até 1932. Foi capelão das Ursulinas [1907-1910], junto ao Seminário, e nos Moinhos (Miranda do Corvo) [1911-1940]. Cónego capitular da Sé de Coimbra, nomeado pelo Bispo D. Manuel Luís, em 5 de Janeiro de 1922. Faleceu em 28 de Fevereiro de 1944, com 83 anos, no Seminário de Coimbra.

O Padre Tomás Fernandes Pinto nasceu em 18 de Março de 1880, na freguesia de S. Nicolau da Vila da Feira, na diocese do Porto. Frequentou o Seminário do Porto e concluiu o Curso Teológico em 1903. Foi prefeito e professor no Seminário dos Carvalhos, onde leccionou Ciências Físico-Químicas e Naturais. Reitor da igreja de S. João Novo e professor de Filosofia no Seminário da Sé, no Porto. Depois, o Bispo D. Manuel Luís chamou-o para Coimbra, onde foi Vice-Reitor do Seminário [1916-1936] e professor. Incardinou-se nesta diocese e foi Cónego da Sé de Coimbra. Faleceu em 10 de Outubro de 1940, na freguesia de Santa Cruz, em Coimbra.

O Padre Elias de Aguiar nasceu em 2 de Fevereiro de 1880, em Vila do Conde. Concluiu o Curso Teológico no Seminário Conciliar de Braga, em 17 de Junho de 1901; e foi ordenado Presbítero em 27 de Julho de 1901. Regente do Orfeão Académico de Coimbra, desde 1915, professor de História da Música e Canto Coral, na Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra, e também leccionou no Seminário de Coimbra. Incardinou-se nesta diocese e foi Cónego da Sé conimbricense. Faleceu em 13 de Março de 1936, nessa cidade.

Padre Manuel Mendes