
PÃO DE VIDA
Padre Américo!
— No 95.º aniversário da ordenação presbiteral
Em Julho, de forma especial e felizmente, há mais notícias e convites para ordenações presbiterais e aniversários destas, que muito nos alegram. O Povo de Deus exulta sempre com enorme alegria, nas Ordenações, sendo que os ministros ordenados são indispensáveis na vida da Igreja! Acontece que Julho tem também grande significado no itinerário de vida de Américo Monteiro de Aguiar. De facto, nesse mês, houve acontecimentos marcantes, nomeadamente de ordem pessoal e eclesial, que foram decisivos no seu caminho de cristão à procura da felicidade, isto é, no chamamento à santidade.
Conforme escreveu, numa carta datada de 4 de Dezembro de 1923, dirigida ao seu amigo Simão Correia Neves, diz assim: «Em meados de Julho [de 1923] lembro-me de recolher a uma Ordem de Religiosos e vou ao Porto falar com um Sr. P.e Franciscano. Este manda-me a Tuy falar ao Provincial. Vou e não o encontro. Volto em Setembro. Neste meio tempo sou assediado por dúvidas terríveis e uma luta constante de ideias me atormenta. Em Setembro falo com o Provincial e fico dois dias em Tuy. […]» [Facetas…, in O Gaiato, N.º 417, 5 Março 1960, p. 8]. Américo de Aguiar, com 35 anos, sofreu uma martelada vocacional[segundo disse em Penafiel ao P.e Avelino Soares, Pároco e seu antigo companheiro de escola – vd. O Gaiato, N.º 327, 15 Setembro 1956, p.2]. Na verdade, recebeu um forte chamamento do Senhor, depois de outros desde rapazito, a que se seguiu a martelada final.
O seu
percurso pessoal até à ordenação de Presbítero é extraordinariamente rico,
embora existam vários tempos e momentos menos esclarecidos. Aconteceu, então,
um dia muito feliz da sua vida, cuja notícia foi dada pelo jornal da Diocese de
Coimbra, onde foi recebido e fez a sua formação presbiteral, da qual recortámos
aqui o seguinte: «No domingo passado, 28 [de Julho], S. Ex.ª
Rev.ma o Senhor Bispo Conde [D. Manuel Luís Coelho da Silva]
conferiu as seguintes ordens: Presbítero – aos revs. Diáconos: Américo
Monteiro de Aguiar, de Galegos, Diocese do Porto; Augusto Nunes Pereira, de
Fajão, José Marques da Silva, de Almoster; […].» [Ordenação no Seminário,
in Correio de Coimbra, N.º 374, 2 Agosto 1929, p. 4]. Estamos, pois, a
celebrar o seu 95.º aniversário da ordenação de Presbítero e da Missa Nova,
ocorridas em 28 e 29 de Julho de 1929, respectivamente na Capela de Nossa
Senhora da Anunciação e na Capela das Irmãs Coadjutoras, no Seminário Episcopal
de Coimbra – da Sagrada Família.
Para enriquecermos estas notas sobre esta comemoração festiva, é possível transcrever uma carta muito interessante e séria, que temos em mãos, da autoria do Padre Américo, sobre as suas Bodas de Prata presbiterais. Foi dactilografada em papel timbrado da Obra da Rua, com assinatura manuscrita, e reza assim:
«PP. Adriano, Horácio, Carlos
Vamos fazer aqui a festa do meu quarto de século da Ordenação sacerdotal; desde o dia 22 a 29 deste [Julho], podendo ser. Aplicai por mim o Santo Sacrifício. Não podendo ser todos os dias, que o seja, sem falta, o dia 29. Fazei-o encarados à Hóstia. Tomai-A por Jesus vivo e dizei-LHE coisas vossas. Pedro precisou sempre mais do que os outros!
Eu preciso. Eu sou um retrógrado. Não estou à altura. Opróbrio e confusão rodeiam-me. Ajudai-me.
Não se diz nada a ninguém. Não se escreve. Tudo se passa entre nós, como bons companheiros e amigos e interessados.
Paço de Sousa, dia de S. Vicente de Paulo, de 1954.
P. Américo!».
Apenas algumas notas acessórias, pois o conteúdo desta carta tem pano para mangas. Nestas linhas e entrelinhas se perceberá um dos motivos pelos quais não escreveu o livro De como eu subi ao altar. O Eu foi um empecilho. Nos dias próximos desta festa, o Padre Américo fugiu para o Gerês, ausentando-se [?] da Casa do Gaiato de Paço de Sousa, por razões que só Deus sabe e ele também. Na verdade, nesses dias desejou festa recolhida, sem exterioridades que maculassem a sua alegria profunda e continuada desde a ordenação presbiteral. Sobre a memória litúrgica de S. Vicente de Paulo, sua devoção, nesse tempo era no dia 19 de Julho, referida ao dia em que se deu a aparição de Nossa Senhora a Catarina Labouré, Filha da Caridade, em Paris [Rue de Bac, 140], diante do altar em que se guarda o coração de S. Vicente de Paulo; mas, actualmente, é no dia 27 de Setembro, seu dies natalis.Note-se, ainda, o bem conhecido ponto de exclamação, depois da abreviatura de Padre e do seu nome de baptismo. De sublinhar que não há dúvidas, de acordo com as fontes, sobre o dia da sua ordenação presbiteral: 28 de Julho de 1929.
Sobre a celebração do 25.º aniversário de ordenação presbiteral, o Padre Américo acabou por redigir um artigo de fundo, cuja densidade é grande e explica bem a sua citada missiva. A transcrição integral é uma explicação cabal. Eis: «Eu tinha pedido aos meus três colaboradores, por uma circular, que se lembrassem de mim no dia 29 de Julho, por ter chegado naquela data o quarto de século da minha Ordenação. Pedi-lhes a Missa daquele dia. Pedro foi o que mais precisou também por quem Jesus mais pedia! Eu pedi aos três a Missa naquele dia.
O que feito e assim movido, retirei-me para as Caldas do Gerez. Ia ter ali o dia por minha conta, sozinho, como convém a hora de tamanha intimidade. Ninguém como eu a poderia sentir e viver. Porém aparece o indiscreto. Um jornal do Porto falou. Deu-se a invasão! Ser-me-ia impossível responder a cada mensagem, de tantas, e assim, por esta forma, respondo a todos. Eu acredito e compreendo que a acção social do volume da Obra da Rua é capaz de suscitar muita simpatia pela sua natureza. Acredito. E se a colocamos no seu plano sobrenatural, isso então muito mais. Eis a razão do alvoroço. Um da comunidade de Paço de Sousa dizia – nada valeu fugir, estamos todos cheios da sua presença. Se a minha ausência assim causa presença, que fará a Morte! Ainda hoje existe o ignorante que afirma acabar a Obra com a morte do seu fundador. E eu digo que não. Qual profeta da Nova Lei, eu afirmo que ela começa no dia em que eu morrer. Estamos todos cheios da sua presença.
Outro dizia assim numa carta: «Deus, sempre atento às nossas necessidades, chamou a Si há 25 anos aquele que vinha a ser nosso Bom Pai.
Estamos, portanto, em festa, e festejar havemos também as bodas de Ouro e mesmo as de Diamante. Não importa que o lugar da festa mude, pois no Céu a alegria ainda é maior.
Pelos Gaiatos».
Outra afirmação do que acima se diz. Isto não são cartas estudadas. Não são ditadas. Os nossos rapazes têm liberdade de dizer o que sentem quer por cartas quer telegramas. Com este mesmo sentir, vieram telegramas de todas as nossas casas e África também! O que será o dia da minha Morte!
Da cidade do Porto, eram vales telegráficos e no sítio dos remetentes dizia – Silêncio.
De maneira que a nossa curiosidade ficou à porta!
Aqui tudo é silêncio; o que me deram em afectos e em moeda corrente. O que Deus nos dá. Tudo. Sendo pois a nossa obra uma coisa diferente, ninguém repara, de tantos e tantos, que eu feche a data com um fervoroso aperto de mão a cada um. E até lá. No Céu a alegria ainda é maior.» [Uma data – O Gaiato, N.º 273, 14 Agosto 1954, p. 1].
Padre Manuel Mendes