PÃO DE VIDA
No Centenário do Padre Horácio
Da Lentisqueira à Casa do Gaiato
«Os senhores ajudem o P.e Horácio, que tem às costas a cruz de Coimbra, não vá ele desanimar. — Padre Américo»
O Gaiato, N.º 177, 9 Dez. 1950, p. 2.
No dia 28 de Janeiro, Domingo, comemoram-se cem anos do nascimento do Padre Horácio (1924–2024), como ficou conhecido na Obra da Rua e pelos seus amigos. É uma data significativa para ser festivamente celebrada na Eucaristia e bem recordada no jornal O Gaiato, onde escreveu crónicas de vida, com boa caligrafia, na sua maioria sob o título 'Tribuna de Coimbra' e depois 'Património dos Pobres', desde 25-11-1950 a 20-5-2000.
Num tecido simples, registamos apenas um açafate de informações — sendo que algumas delas inéditas — do seu itinerário de vida, que entregou a Cristo Jesus na Igreja — no serviço aos pobres e especialmente aos Rapazes da Casa do Gaiato de Miranda do Corvo e do Lar de Coimbra, desde 29 de Setembro de 1950 a 20 de Junho de 1992. Foram muitos Rapazes que acolheu e orientou na vida, cuidando das suas necessidades, com os colaboradores, em ambiente familiar próprio da Obra da Rua.
Eis a página escrita de abertura do livro da sua vida, respigada dos 'Assentos de Baptismos de Mira — 1924', por deferência do Pároco dessa Unidade Pastoral: «Horácio Francisco Azeiteiro, filho de Manoel Francisco Azeiteiro, negociante e de Maria de Miranda Moraes, casados catholicamente n'esta freguesia e n'ella residentes, no logar da Lentisqueira, neto paterno de Manoel, digo, de João Francisco Azeiteiro e de Rosa de Miranda e materno de Manoel Francisco Azeiteiro Senior [?] e de Maria de Miranda. Nasceu n'esta freguesia a vinte e oito de Janeiro de mil e novecentos e vinte e quatro e foi solemnemente baptisado n'esta egreja por mim a dois de Março do mesmo anno. Foi padrinho Manoel Augusto Azeiteiro, solteiro, e madrinha Arminda de Miranda, solteira, ambos da Lentisqueira, assignando comigo esta e não aquelle, por não saber.
A Madr.ª Arminda de Miranda/ O Coadjutor — António Caravella.» Na margem esquerda deste registo baptismal: «N.º 24/ Horácio/ Lentisqueira. 1.º Recebeu a Sagrada Ordem de Subdiaconado no dia 6 de Novembro de 1940. 2.º Recebeu a Confirmação conforme juramente do próprio, nesta Igreja Paroquial de Mira. Recebeu a ordem de Presbítero em 1950.».
Do arquivo da Cúria Diocesana de Coimbra, recolhemos alguns dados, cuja consulta agradecemos. Na ficha sacerdotal, pela sua mão, a filiação está assim: Manuel Francisco Azeiteiro Júnior e de Maria de Miranda Morais. Mais: em 4 de Outubro de 1937 [com 13 anos], deu entrada no Seminário Menor, constando da lista de alunos em 1937-1938 [vd. P.e João Coutinho Veríssimo — Seminário da Imaculada Conceição da Figueira da Foz. Coimbra, 1987].
E continuemos com um testemunho pessoal: «Comecei a conhecer o Padre Américo pela sua secção 'Pão [Sopa] dos Pobres', escrita semanalmente no Correio de Coimbra, em 1939. Eu era aluno do Seminário Menor da Figueira da Foz. Nos primeiros meses de 1941, o Padre Américo acompanhou um grupo de rapazes no Lar de Coimbra, que tinha fundado pouco antes, para um desafio de futebol connosco. Fiquei a conhecê-lo pessoalmente.
Em Maio do mesmo ano, alunos e professores do Seminário fomos de passeio, em três camionetas, à Casa do Gaiato de Miranda do Corvo, onde o Padre Américo nos ofereceu o almoço. A Casa do Gaiato tinha treze meninos. [vd. fotografias, no Arquivo da Obra da Rua — Paço de Sousa]. Ficámos muito bem impressionados e pedimos ao senhor vice-reitor para convidar o Padre Américo a pregar-nos o Retiro do fim do ano lectivo, convite que foi aceite.
[…] No mesmo ano mudei para o Seminário Maior de Coimbra. Sempre que o Padre Américo passava por lá tinha de falar aos seminaristas. Nós ficávamos maravilhados com as suas palavras a testemunhar o encontro com Pobres e Doentes.» [O Gaiato, N.º 1304, 5 Março 1994, p. 5.].
Concluídos os estudos teológicos, no Seminário de Coimbra, em 13 de Agosto de 1950, com 26 anos, na Sé Nova de Coimbra, foi ordenado Presbítero, pelo Bispo de Coimbra, D. Ernesto Sena de Oliveira, Bispo de Coimbra [1948-1967].
Com o testemunho do Padre Américo, no serviço aos Pobres, e a necessidade premente, depois aconteceu um convite inevitável, conforme carta inédita, com o timbre da Obra da Rua, endereçada para: Padre Horácio Francisco/ Lentisqueira — Mira:
«24/8/50 — Dia de S. Bartolomeu Apóstolo.
Padre Horácio/ Podes ser um membro activo d'esta Obra Social e experimentar nela a tua generosidade, como o Mestre quer e espera de nós. O teu Prelado não impede. Diz algo neste sentido ao teu amigo in C. J./ P. Américo!». [Casa do Gaiato de Miranda do Corvo — Padre Horácio: Pasta de Correspondência de Pai Américo e Família].
Não vimos a sua nomeação, escrita, mas de facto esse convite — para serviço na Obra da Rua, em Miranda do Corvo e Coimbra — foi ratificado pelo seu Bispo de Coimbra, pois Padre Horácio seguiu para a primeira Casa do Gaiato, no final de Setembro de 1950.
Padre Manuel Mendes