PÃO DE VIDA

De Cernache do Bonjardim

A vetusta casa de Cernache do Bonjardim, na qual centramos o nosso olhar, é bem historiada nas páginas de Casa que conta, cujo exemplar à mão tem esta dedicatória: Ao nosso grande Amigo Arquitecto António de Freitas Leal, lembrando os tempos de voluntariado social e lembro também seus filhos João e Gonçalo (p.207), of. Violante e Tomás, Lisboa, 28.7.2015. Na verdade, do capítulo 9. «Batatas arranjo eu» Padre Américo [p.91-93], extraímos um naco com interesse, que ousamos transcrever: Padre Américo «foi sempre uma referência para a família, principalmente para os avós Maria do Céu e Gualdim e também para seus filhos, Higino, António e Maria Violante.». Mais adiante, continua: «Gualdim acompanhava a sua filha Maria Violante a fazer tratamentos nas termas do Gerês. Foi lá que conheceram o Padre Américo, onde diariamente Gualdim o ajudava na celebração da missa. Desde essa altura, durante alguns anos, passaram a encontrar-se lá nas mesmas datas.

Numa viagem de regresso para Cernache do Bonjardim, o avô Gualdim e a tia Maria Violante, foram cumprimentar o Padre Américo a Paço de Sousa. Cansado, Gualdim sentou-se na cadeira do Padre Américo para dormir uma sesta, e comentou: 'Já posso dizer que me sentei na cadeira de um santo', ao que Padre Américo respondeu: 'E eu posso dizer que um santo se sentou na minha cadeira'.

De uma carta do Padre Américo retiro os seguintes dizeres: 'Maria Violante: Bem hajas pela tua fidelidade à Casa do Gaiato. O Pai terá de arranjar-se com as autoridades, para fazer chegar às nossas mãos o precioso - dado [azeite]. Estação de Cête: Remete-se ao vizinho. Se o Higino desse o bacalhau, batatas arranjo eu! Reza. Olha que o barro de que sou feito é muito quebradiço. Recados a todos do Sempre fiel, [P.] Américo!'. E ainda dois cartões: 'Paço de Sousa. Violante: Sim, para sempre ser quem és. [P.] Américo!' e: 'Olha; Bem hajas pelas assinaturas. És tu quem leva a camisola amarela! Teu muito dedicado [P.] Américo!'.

Foi o Padre Américo, em certos aspectos, sobretudo na acção social, inspiração para a obra de Maria Violante de Queiroz e Mello que durante tantos anos desenvolveu no CSSNSM [Centro Social de S. Nuno de Santa Maria] em CB [Cernache do Bonjardim].».

Essa histórica casa [1898] situa-se perto de uma rotunda com a estátua de S. Nuno de Santa Maria. Tendo em conta a história familiar, nela foram colocadas duas lápides [em 19-IV-2011], tendo uma placa esta legenda: No século XX foram acolhidos nesta casa pela mesma família os Patriarcas das Índias Orientais D. Mateus Xavier e D. Teotónio Vieira de Castro, o Arcebispo de Mitilene D. João de Lima Vidal, o Bispo de Portalegre depois Arcebispo de Évora D. Manuel da Conceição Santos, o Arcebispo de Cízico D. Manuel Ferreira da Silva, o Padre Américo, o Cónego Joaquim Freitas e o Padre Joaquim Caetano. Seja louvado Nosso Senhor Jesus Cristo e Sua Mãe Maria Santíssima. A outra placa reza assim: Exilado da sua Diocese o grande missionário e Bispo do Porto D. António Barroso foi a 19 de Abril de 1911 benignamente acolhido nesta casa de Cernache do Bonjardim pela família de Dona Maria do Céu Heitor de Mattos e Silva e Dr. Gualdim António Pereira de Gouveia de Queiroz e Mello onde permaneceu por mais de um mês suportando cristãmente o calvário a que foi sujeito. No centenário do acontecimento - 2011.

Ficam ainda algumas simples informações adicionais sobre intervenientes nas missivas supra. Assim, o Dr. Gualdim António de Queiroz e Mello [1868†1961], era da Casa da Frazoeira, em Dornes - Ferreira do Zêzere, formou-se em Medicina em Coimbra e casou em 1899 com D. Maria do Céu Heitor de Mattos e Silva [1880†1961], de Cernache do Bonjardim. Este casal, que passou a viver em Cernache do Bonjardim, teve três filhos: Higino [1900†1960], António [1907†1965] e Maria Violante [1922†2013]. Sobre Higino, tendo sido da Comissão Reguladora do Comércio do Bacalhau, percebe-se o pedido. António, sogro do autor do citado livro, colaborou com Padre Américo na promoção de casas para pobres em Tomar. Maria Violante desenvolveu uma notória acção social ao serviço das pessoas necessitadas, em Cernache do Bonjardim.

O Dr. João Manuel Godinho de Queiroz e Mello [n.1945], sendo Médico-Cirurgião Cardiotorácico, realizou o primeiro transplante de coração em Portugal [a 18-VIII-1986]. É filho de António Mello e Maria do Céu Mendes Godinho; e neto de Maria do Céu Silva e de Gualdim Mello. Sua irmã, Maria Violante, e amigos dedicaram-se ao alojamento de famílias ciganas, em Algés.

O Dr. Gualdim era filho do Dr. António de Mattos e Silva, também Médico, e de Maria Emília de Heitor Deus. Foram ambos professores no Colégio das Missões Ultramarinas. De reter, para além do mais, que o Dr. Gualdim - um patriarca dessa família e amigo de Pai Américo - se ufanava de ter sentado na cadeira de um santo!...

Padre Manuel Mendes