PÃO DE VIDA

Do Venerável Padre Américo

Recoveiro dos Pobres

No serviço aos últimos, pelas ruas de Coimbra, os passos dolorosos do Padre Américo, como recoveiro dos pobres, foram-se orientando para a ajuda perseverante aos mais pobres, em diversos sítios de misérias: tugúrios, becos [v.g. Beco do Moreno], barracas [v.g., Conchada], hospitais [v.g., dos Lázaros], cadeias, etc. Por isso, teve de pedir auxílios urgentes para muitos pobres, em belas crónicas sob o título Sopa dos Pobres, no Correio de Coimbra [desde 1932]; depois, seleccionadas e recolhidas nos quatro volumes de Pão dos Pobres: do que eu vi em casa deles e de como tratei seus filhos [1941, 1942, 1943 e 1984].

Nesta missão, o seu Bispo de Coimbra confiou-lhe a Sopa dos Pobres, na Rua da Matemática, sob o patrocínio de S. José, como escreveu: A Sopa dos Pobres, criação do Senhor D. Manuel Luís Coelho da Silva, foi inaugurada por ele em o dia 19 de Março de 1932. Nessa data andava eu enfermo e, como não pudesse trabalhar, roguei ao então meu Prelado que me deixasse ao menos visitar Pobres e cuidar da sopa deles, serviço este compatível com as minhas dores de cabeça de então [Pão dos Pobres, Coimbra, 1941, I, p. 1]. Em tempo de penúria, entregou-se com urgência à primeira das obras de misericórdia [corporais], pois o Evangelho entra pelo estômago [Pão dos Pobres, I, 1941, p.279]. O Papa Pio IX proclamou S. José patrono da Igreja em 8-X-1870; e data de 12-I-1935 a publicação da Consagração da Diocese a S. José e à Sagrada Família, pelo Bispo de Coimbra, D. Manuel.

Nessa época muito difícil da História do século XX, depois da crise de 1929, com a grande depressão, que se espalhou pelo mundo, o Padre Américo aproximou-se e ajudou muitos pobres em situações de misérias graves, mas sentia pena de não poder acudir a mais carências extremas, como se lamentou: Ai! que se Coimbra acordasse e fizesse ela, pela mão dos que podem, o que eu sozinho não posso fazer! [Pão dos Pobres, II, 1942, p. 133]. No serviço aos Pobres, entretanto, foi saudando a proximidade e ajudas cristãs das Conferências Vicentinas [1916] e das Criaditas dos Pobres [1932], em Coimbra. Depois da Primeira República, para recristianizar a sociedade, em 1933 surgiu a Acção Católica em Portugal [Mons. Luís Civardi - Manual de Acção Católica, I vol. - Lx.a, 1934, II vol. - Porto, 1936].

Entretanto, teve também outros serviços pastorais, de que confirmámos os registos [Arq.º Cúria Dioc. Coimbra]: foi nomeado Confessor ordinário no Refúgio da Rainha Santa [Out.º 1932] e Capelão na Casa de Saúde [30-V-1934, Rua da Sofia], em Coimbra. Em 27 de Agosto de 1934, obteve licença para absolver dos pecados reservados ao Prelado [o homicídio e o incêndio com propósito de causar dano - vd. D. Manuel Luís Coelho da Silva - Constituições do Bispado de Coimbra, Coimbra, 1929, n. 816, p.170].

Sobre a sua acção eclesial em Coimbra, deixou este inciso do mandato do seu Bispo: O meu Prelado chama-me a contas e pergunta-me por elas; eu digo-lhe que as não tenho nem as faço. Resposta pronta e textual: a sua vida é um mistifório, e nunca mais me interrogou [Pão dos Pobres, I, 1941, p. 2]. Caminhando com fé e esperança, dos seus passos e frutos da caridade junto dos mais pobres, afinal foi dando contas no jornal diocesano Correio de Coimbra. O seu serviço aos pobres era assim marcado por incompreensões e perseguições, especializando-se na ciência da Cruz de Cristo, conforme confidenciou: [...] b) Dado a esta missão com licença superior, não tardou que fosse observado e tido por imprudente e como tal comunicado [denunciado] a seu Bispo, por alguns sacerdotes de boa consciência. O Prelado não se manifestou. c) A seguir são os directores dos hospitais e sanatórios de Coimbra que o tomam por indesejável na sua actuação entre os doentes e pedem ao Prelado que desterre [o desterrem]. Outra vez o Ex. mo D. Manuel Luiz Coelho da Silva ignora o dito. d) Finalmente é um ofício do então Ministro da Justiça, que o manda retirar de membro actuante do Patronato das Prisões, pelas suas inconveniências. e) Assim afastado dos Pobres e dos Reclusos, o fundador dá-se às crianças da rua e organiza um grupo de cinquenta delas, em colónia de montanha [...]. [O Gaiato, n. 363, 8 Fev. 1958].

Entretanto, como descortinámos, por despacho do Director Geral, interino, dos Serviços Jurisdicionais de Menores, A. Afonso Salaviza, de 30 de Março, foi confirmado no seguinte cargo: Padre Américo Monteiro de Aguiar - aprovado o seu contrato, como pessoal extraordinário, para assistente religioso do Refúgio da Tutoria Central da Infância de Coimbra, por um ano [...]. [Diário do Governo, n. 123, 2.ª série, 30 Maio 1938, p. 2716]. Ainda foi possível encontrar o respectivo Diploma de funções públicas, de 3 de Junho, com Declaração de Compromisso, de 1-VI-1938 [que nos foi confiado e no Memorial Padre Américo].

Padre Manuel Mendes