PÃO DE VIDA
De D. António Barroso
Continuação do número anterior
Com base num Certificado de Crisma de Américo Monteiro de Aguiar [passado em 1-X-1926], arquivado na Cúria Diocesana de Coimbra, na sua permanência no Porto, como marçano numa loja de ferragens, desde Outubro de 1902, terá sido crismado pelo Bispo do Porto, na Sé Catedral. Na verdade, em 2 de Agosto de 1899, D. António Barroso entrou solenemente, na Diocese do Porto, no meio de imensa multidão. Foi sagrado Bispo, na Sé Patriarcal de Lisboa, em 5 de Julho de 1891, pelo santo Cardeal D. José Sebastião Neto - ilustre Prelado que veio a falecer em 7 de Dezembro de 1920, em pobreza franciscana no Convento de Vilariño de la Ramallosa [onde Américo de Aguiar foi recebido, em Outubro de 1923].
Ainda com 14 anos, em Agosto de 1902, Ramiro Monteiro de Aguiar, seu pai, em carta ao filho Padre José, missionário em Cochim, escreveu que não achava o Américo com feitio para padre, contrapondo assim a sua vontade, atendida pela sua mãe Teresa Ferreira Rodrigues, que tinha escrito para o mesmo filho, em Junho desse ano, dizendo: peço-te que me dês andamento a este embaraço em que eu me vejo com este rapaz, ele tem muita vontade de ser padre, vamos a ver se agora o podemos apanhar. Por essa altura, apesar de tudo, seu pai sugeriu que entrasse no Colégio das Missões de Cernache do Bonjardim, o que não veio a acontecer. Nos desígnios de Deus, não seria a hora de deixar as redes... José de Aguiar, o seu irmão mais velho, foi para a diocese de Cochim, levado pela mão de D. João Gomes Ferreira [Aguiar de Sousa (Paredes), 9-VI-1851; Pangim, 4-V-1897], que tinha sido aluno em Cernache do Bonjardim e foi sagrado Bispo em 21 de Agosto de 1887. Era amigo de seu pai, Ramiro de Aguiar, e passou pela Casa do Bairro, em Galegos (Penafiel), no Verão de 1891, segundo António Moreira da Rocha.
Em jeito de curiosidade bibliográfica, encontrámos um espécime interessante, em que se interligam várias figuras eclesiais, pois está assinado por D. António, Bispo do Porto, mais precisamente as Obras Pastorais do Em.mo Cardeal D. Américo Bispo do Porto [2 vols., Typ. a vapor da Real Officina de S. José, 1901-1902], publicadas depois da sua morte [em 21 de Janeiro de 1899]. O exemplar à mão foi oferta do 2.º prémio em mérito moral conferido a Manuel Fernandes do Santos. Este seminarista, segundo dados do Arquivo da Diocese do Porto, nasceu em Romariz, em 7-III-1887, foi ordenado Presbítero em 1-VIII-1909 e faleceu em 15-XI-1963. Sendo pároco da sua terra, escreveu Breves Apontamentos sobre Romariz [Porto, 1940]. Dessa localidade também era natural o sábio Padre Domingos A. Moreira [1933-2011], figura relevante da linguística portuguesa e Pároco de Pigeiros, cujo espólio bibliográfico e documental doou ao município da Feira. Encontrámo-lo várias vezes na Biblioteca do Seminário Maior do Porto, nas suas aturadas e seguras investigações históricas.
Se os santos se fazem ao colo das mães, conforme é manifestado, D. António Barroso é seguramente um dos grandes da Igreja em Portugal, como modelo de missionário e Bispo bondoso e firme. Na sua Pastoral de saudação [27-VII-1899], escreveu com afecto: Podeis crer, filhos caríssimos, que o Paço do vosso Bispo há-de ser o refúgio dos vossos males. E, ainda: Dai aos pobres, que Deus vos pagará cento por um; ide ao tugúrio da miséria salvar a pobreza e ao antro do vício remir desgraçados. No seu Testamento, em 1917, deixou assim escrito: nasci pobre, rico não vivi e pobre quero morrer. Faleceu com 63 anos, depois de uma corajosa e fecunda acção apostólica, em solos africano [1880-1895], indiano [1897-1899] e lusitano [1899-1918] - missionário de três continentes!
Américo - cujo nome deve ao Cardeal D. Américo, Bispo do Porto [1871-1899], predecessor de D. António Barroso - partiu para o Céu também cedo, só com mais os dedos da mão [68 anos], com a qual escreveu aquele panegírico, e depois de testemunhar a pobreza de Jesus na sua vida heróica, como diz S. Paulo:
Conheceis bem a bondade de Nosso Senhor Jesus Cristo que, sendo rico, Se fez pobre por vós, para vos enriquecer com a sua pobreza [2 Cor 8, 9].
Padre Manuel Mendes