PÃO DE VIDA
Do Padre Jacinto de Sousa Borba
continuação do número anterior
Continuamos com muito agrado nesta pequenina missão de escrevinhar algumas breves notas biográficas sobre o Padre Jacinto de Sousa Borba, pois Américo Monteiro de Aguiar veio a encontrá-lo no Colégio de Santa Quitéria, em Felgueiras, no declinar do século XIX, e a acção deste virtuoso sacerdote foi benéfica no seu itinerário vocacional.
Assim, retomando o fio desta meada, aos vinte anos, foi-se definindo bem a vocação de Jacinto de Sousa Borba para filho de S. Vicente de Paulo. Em Abril de 1875, deixou o Brasil e tomou o caminho da Europa, para começar o seu noviciado na casa-mãe dos Padres da Missão, na Rua de Sèvres, em Paris. Entretanto, visitou Bordéus, Dax e Lourdes, com o Padre Luis Forestier. Em 29 de Maio de 1876, ingressou no Seminário Interno e começou os seus estudos de Filosofia, que foi obrigado a interromper por falta de saúde.
Por isso, rumou a Portugal, procurando descanso, onde chegou a 9 de Janeiro de 1877. Refeitas as suas forças, continuou em Lisboa os seus estudos, cuidava do arranjo da igreja de S. Luís e dava algumas lições no Colégio de Maîtrise, anexo a essa igreja. Em 30 de Maio de 1877, na igreja de S. Luís, em Lisboa, perante o altar de Nossa Senhora do Porto-Seguro, na presença do Visitador Padre Miel, pronunciou os seus Votos Perpétuos, religiosos, que o ligaram para sempre à família dos Padres da Congregação da Missão, de S. Vicente de Paulo.
Em Agosto de 1879, regressou a Paris; e recebeu a Tonsura e as Ordens Menores, em 11 de Junho de 1880, das mãos de um Bispo da Córsega, o Subdiaconado nas Têmporas do Pentecostes de 1881, pelo Bispo (lazarista) Mons. Taillabus, e o Diaconado em 16 de Agosto do mesmo ano, das mãos do mesmo Prelado.
A sua precária saúde obrigou-o, mais uma vez, a demandar o lindo céu e o claro sol de Portugal, em Novembro desse ano de 1881, como escreveu o sábio cronista dos Padres da Missão. Entretanto, no dia 24 de Junho de 1882, na capela da Nunciatura, então à Rua do Quelhas, em Lisboa, Jacinto de Sousa Borba foi ordenado Presbítero pelo célebre Núncio Apostólico em Portugal [1879-1883], Monsenhor Caetano Mazella [30-IX-1826;22-XI-1902]. No dia seguinte, celebrou Missa Nova, na igreja de S. Luís, Rei de França. No mesmo dia, em Lisboa, também o Padre Francisco Rodrigues Cruz [29-VII-1859; 1-X-1948], seu amigo, celebrou uma primeira Missa. Este piedoso e bom sacerdote veio a falecer em Lisboa com fama de santidade - o santo Padre Cruz. Depois, o Padre Jacinto Sousa Borba foi exercendo o seu ministério sacerdotal na igreja de S. Luís, em Lisboa, até 1889. Serviu no confessionário, na direcção espiritual do Asilo de S. Luís, à Rua do Carvalho [depois, Luz Soriano], e no ensino na Maîtrise de S. Luís.
Em 1889, o Padre Emílio Miel, Visitador Provincial, enviou-o para o Colégio de Santa Quitéria, em Felgueiras, que estava então em pleno esplendor sob a direcção do inteligente e activo superior Padre Alfredo Fragues [4-X-1856; 5-X-1910]. A sua [do Padre Sousa Borba] dedicação aos rapazes e o seu jeito especial para se ocupar deles evidenciaram-se desde logo, fazendo dele um valioso colaborador dos seus superiores. Ao lado do Colégio de Santa Quitéria, dos pensionistas, funcionava uma Escola Apostólica, para preparar vocações para a Congregação da Missão. Como em 1890 o Padre José Gonçalves, que a dirigia, rumou à Madeira, foi nomeado director o Padre Sousa Borba.
Com a acção e o desenvolvimento que tomou o Colégio de Santa Quitéria, em Felgueiras, os Padres Lazaristas foram convidados a abrir um estabelecimento similar em Amarante - o Colégio de S. Gonçalo. Em Janeiro de 1892, o Padre Sousa Borba foi mandado como gerente desse Colégio, em sede provisória; e empenhou-se no ensino e na construção do novo edifício. Como o Padre Boavida (superior em 1895-1896) foi destinado ao Brasil, o Padre Sousa Borba ficou na direcção desse Colégio. Porém, por dificuldades várias, fechou em 1898; e o Padre Sousa Borba regressou a Santa Quitéria, como director do ensino.
No Colégio de Santa Quitéria, conservou-se durante nove anos. De um justo e belo elogio que o cronista vicentino [Padre Bráulio Guimarães] traçou sobre a acção exercida pelo Padre Sousa Borba, em Felgueiras, eis: muitos homens de hoje, alguns que chegaram na vida a situações do maior destaque, relembram com saudade e gratidão a acção vigilante, perspicaz, fundamentalmente bondosa, mas também firme quando era preciso, que o Padre Sousa exerceu no Colégio de Santa Quitéria. A sua piedade ingénua e fervorosa, o seu amor filial a Nossa Senhora, a Mãezinha do Céu, o seu zelo pela Associação dos Filhos de Maria, de que ele era director, e pela celebração solene do mês de Maio e das festas da Santíssima Virgem, o empenho com que promoveu a erecção, na esplanada do Monte, de um monumento a Nossa Senhora das Graças, e a coroação solene da estátua da Virgem, são alguns de entre tantos e tantos factos em que se evidenciaram os tesouros da sua alma, cheia de fé e de delicados e generosos sentimentos.
Foi precisamente às portas de um novo século que um rapazito à beira de 12 anos, depois de frequentar o Colégio de Nossa Senhora do Carmo, vindo das terras de Penafiel - do Salvador de Galegos, por vontade de seu pai Ramiro Monteiro de Aguiar, foi recebido no Colégio de Santa Quitéria, em Felgueiras. Sobre o momento seguro em que Américo Monteiro de Aguiar chegou a Felgueiras, as fontes escasseiam, pois a borrasca anti-eclesial de Outubro de 1910, com a infeliz perseguição religiosa, também provocou destruição no arquivo desse Colégio... Já demonstrámos noutros escritos [em primeira mão] que Américo Rodrigues Monteiro de Aguiar [sic] fez o exame de instrução primária [2.º grau - 4.ª classe] no dia 8 de Agosto de 1899, na cidade de Penafiel, de acordo com notícia da imprensa local [O Penafidelense, de 11-8-1899], que revelámos por consulta directa, e segundo um naco autobiográfico incisivo, em que confidencia: Eu fiz exame de primeiras letras mesmo na pontinha do derradeiro quartel do século XIX [O Gaiato, de 15-10-1944]. Eis, ainda, o testemunho de seu irmão Padre José Monteiro de Aguiar, arqueólogo e historiador penafidelense, sobre o início desta nova fase escolar: Em Outubro de 1899 foram os dois, António e Américo, para o Colégio de Santa Quitéria, em Felgueiras. Aquele frequentava o 2.º Ano dos liceus; este, francês e português, e depois estudará inglês e alemão, para ir para Lourenço Marques. O Américo manifestou-se bom estudante, melhor do que o António.
Não encontrámos o paradeiro das fichas de matrículas dos alunos desse tempo, pois sumiu-se o arquivo antigo do Colégio de Santa Quitéria, devido à tomada de posse dos seus bens em 20 de Outubro de 1910, por uma força do Regimento de Infantaria 20, de Guimarães. Noutra ocasião, tivemos acesso a uma lista [manuscrita, feita a posteriori], discriminativa dos alunos que frequentaram o Colégio entre 1898 e 1900, da qual se poderia inferir que Américo de Aguiar teria ido para o Colégio de Santa Quitéria em 1898, o que não nos parece viável, pelos testemunhos credíveis acima aduzidos. Dessa informação se fez eco o Padre Carlos Moura, C.M., no livrito Monte de Santa Quitéria - Felgueiras [2.ª ed., 2018], comemorativo dos 150 anos da presença dos Padres Vicentinos em Felgueiras. Os Lazaristas entraram aí pela mão do Padre Joaquim José Álvares de Moura [19-XI-1815; 17-XI-1881], autor da obra Horas do Exercício Espiritual do Christão ou Collecção de orações, devoções, exercicios e practicas Religiosas, com que o Christão deve nutrir o seu espirito. [4.ª ed., Porto, 1862], de que temos um precioso exemplar, em que consta uma oração a Santa Quitéria, terminando assim: pela sua intercessão sejamos livres das ciladas e furor do inimigo infernal, e preservados da peste e de todas as enfermidades do corpo e da alma. Por Jesus Cristo Nosso Senhor.
Padre Manuel Mendes
Continua no próximo número