PÃO DE VIDA
Uma cartinha de Américo
É com júbilo, neste tempo de graça, que celebramos o 130.º aniversário do Servo de Deus Padre Américo, como diz o profeta Isaías: Alegrai-vos com Jerusalém, rejubilai com ela, vós todos que a amais; regozijai-vos com ela, vós todos os que estáveis de luto por ela (Is 66,10). Porém, é feita memória deste acontecimento infelizmente em dias de luto nacional (na hora em que escrevemos), por mais outra tragédia devido aos incêndios com perdas de vidas humanas (mais de cem pessoas, em quatro meses) e a maior área ardida na última década.
A Igreja não pode deixar de fazer memória das maravilhas de Deus pelo Seu povo. Isto apesar de tantos e tamanhos sofrimentos, como as perseguições religiosas, no nosso tempo. Não se esqueçam os martírios no século XX, do nazismo ao comunismo, em que pereceram tantas vítimas, lembradas por Aleksandr Soljenítsin n'O Arquipélago Gulag: os cristãos foram uma multidão, levas e ossários, levas e ossários, quem contará esses milhões?
O Papa Francisco tem salientado a importância da memória. Recordar é essencial para a fé como a água para uma planta: tal como uma planta sem água não pode permanecer viva e dar frutos, assim acontece à fé se não se sacia na memória de quanto o Senhor fez por nós. Na verdade, com o exemplo de Jesus, a memória faz-nos presente uma verdadeira nuvem de testemunhas (Heb 12,1). Entre elas, é justo salientar algumas pessoas que fizeram germinar a alegria nos nossos corações: Recordai-vos dos vossos guias, que vos pregaram a palavra de Deus; observai o êxito da sua conduta e imitai a sua fé. Jesus é o mesmo, ontem, hoje e pelos séculos (Heb 13,7). Muitas vezes são pessoas simples e próximas de nós, como diz S. Paulo a Timóteo: Ao lembrar-me das tuas lágrimas, anseio ver-te, para completar a minha alegria, pois trago à memória a tua fé sem fingimento, que se encontrava já na tua avó Lóide e na tua mãe Eunice e que, estou seguro, se encontra também em ti (2 Tm 1,5).
Fazer memória de um percurso de cento e trinta anos, desde o feliz nascimento de Américo em Galegos (Penafiel), aviva-nos a consciência do seu contexto histórico, do itinerário familiar e vocacional de Américo Monteiro de Aguiar, e damos graças a Deus pela sua vida. Também nos ajuda a sentirmo-nos parte de uma história que nos precede, porventura que vivemos e à qual pertencemos. Isto deve motivar-nos para um maior empenhamento a fazer o bem no mundo e ao serviço da Igreja, em especial aos mais pobres.
Ao celebrarmos este 130 anos, é basilar ainda sentirmo-nos herdeiros de um património espiritual e histórico que somos chamados a preservar, a valorizar e a dar a conhecer, com novos frutos. Trata-se de guardar bem a memória, sabendo fazer memória, como afirmou o Papa Francisco: saber reconhecer as próprias origens, para voltar ao essencial e lançar-se com fidelidade criativa na construção de tempos novos.
Por tudo isto, em boa hora foi empreendida a construção e preparação do Memorial Pai Américo - Obra da Rua, aberto em Paço de Sousa precisamente no dia da celebração do seu 130.º aniversário natalício, com uma interessante Exposição documental e biblio-iconográfica como embrião de um museu vivo.
Assim, apoiados na memória grata e interpeladora do passado, é também boa ocasião para um dinamismo vocacional e construirmos o futuro, hic et nunc, como frisou o Papa João Paulo II, na Carta Apostólica Novo Millenio Ineunte (de 6-1-2001): Agora, devemos olhar para a frente, temos de fazer-nos ao largo, confiados na palavra de Cristo: Duc in altum!
Padre Manuel Mendes