Pão de Vida 

Padre Américo e dois companheiros

No mês de Julho, pela estiagem, a Igreja tem a graça de colher algumas espigas de trigo maduro para assim ser celebrada a Eucaristia nas comunidades cristãs. O ano vai de grande seca. Porém, chegam boas notícias (Coimbra, Porto...) de jovens chamados e confirmados para a entrega total ao Bom Pastor num mundo sedento de justiça e faminto de Amor. É, pois, de agradecer a alegria eclesial por aqueles em quem são impostas as mãos pelos Bispos e enviados para o serviço aos outros, em especial os mais frágeis.

Neste tempo, é benéfico e inquietante fazer memória de um dia feliz para três condiscípulos que, em Coimbra, foram configurados com Jesus Cristo, Cabeça, Pastor e Servo. É a 28 de Julho que se perfazem 88 anos da ordenação presbiteral do Diácono Américo Monteiro de Aguiar. Na verdade, no fim do 3.º ano do Curso Teológico, com 41 anos, recebeu a Ordem de Presbítero das mãos do Bispo de Coimbra D. Manuel Luís Coelho da Silva, na Capela de Nossa Senhora da Anunciação, do Seminário Episcopal de Coimbra. Nesse dia, também foram ordenados: Augusto Nunes Pereira, de Fajão, e José Marques da Silva, de Almoster.

Depois, em 29 de Julho, celebrou a Missa de início de ministério, na Capela das Irmãs Coadjutoras do Seminário de Coimbra. Entretanto, em frugal almoço, afirmou: já não tenho tempo de perder mais tempo! Oito dias depois, a 5 de Agosto, celebrou outra Missa Nova, na Igreja paroquial do Salvador de Paço de Sousa, vizinha da sua terra natal, oferecendo-a pelos seus, em especial a mãe Teresa (daí natural) e o pai Ramiro.

Enquanto concluía a sua formação Teológica, foi nomeado Prefeito e Professor de Português; e, também, celebrava na Capela de Casais do Campo e na Igreja de Santa Cruz (Coimbra). Com surpresa (ou não!) pediu a readmissão na Ordem dos Frades Menores, resolvida pelo Definitório a 29 de Dezembro de 1929; mas que não se concretizou... A sua vocação de Caminheiro da Luz e a missão de Amigo dos Pobres ainda não estariam sintonizadas?! Como esclarecimento pertinente, note-se que ainda teve de fazer acto do 4.º ano Teológico, a 15 de Abril de 1930.

O seu condiscípulo Padre Augusto Nunes Pereira, que nasceu a 3 de Dezembro de 1906 e teve o seu passamento a 1 de Junho de 2001, em Coimbra, serviu a Igreja como Pároco e foi também artista exímio, jornalista e escritor. Seu pai António fazia santos, conforme escreveu. O conselho do companheiro Padre Américo ajudou-o também a determinar-se na sua opção pela beleza artística: Pode-se ser padre e artista. Repara, por exemplo, em Fr. Angélico que, sem deixar de ser um bom monge, foi o artista que foi.

Tem, assim, muito cabimento e sentido arquivar nestas páginas vivas um belo naco de prosa, sobre a feliz ordenação destes amigos de Deus, vindo a lume em Julho de 1999, no Correio de Coimbra. Eis, então, um lindo testemunho de quem viveu o acontecimento - o Padre Augusto Nunes Pereira:

Há setenta anos. Os seminaristas de Coimbra encontravam-se na Colónia de Férias, em Buarcos, repartindo o tempo de forma útil e agradável.

Entre todos havia três certamente mais concentrados, naqueles derradeiros dias de Julho: eram os três diáconos, que no dia 28 desse mês iriam receber das mãos de D. Manuel Luís Coelho da Silva a Ordem do Presbiterado.

A ordenação, nessa altura, não obrigava a grande solenidade, e desta vez seria na recolhida capela da Anunciação, na 2.ª Prefeitura, na maior intimidade. A preparação próxima, além do retiro, tinha sido o exercício das cerimónias da Missa, orientado pelo P.e Manuel Antunes.

Éramos três: Américo Monteiro de Aguiar, José Marques da Silva e eu, que à maneira da história de Job, fiquei até agora para contar a história.

O P.e Américo reservou os últimos dias para se recolher mais profundamente, num misto de confusão e de alegria; retirou-se para Coimbra, donde me escreveu uma carta na qual dava notícias suas, e no fim tinha uma daquelas suas frases que resumiam muita coisa: "Olhe que o padre ordena-se, não para ganhar, mas para perder a vida".

Não sei como foi a Missa Nova dos meus dois companheiros. A minha foi no dia 6 de Agosto, na capela da minha aldeia, à vista de imagens esculpidas por meu pai, e tendo em volta todos os condiscípulos, não obstante a falta de estradas e de transportes.

Recordo a alegria de minha mãe, e a minha surpresa ao ver que me dava "senhoria" - "Tu agora és ministro do senhor!"

Foi há setenta anos. Graças a Deus!

E Deus vai distribuindo abundantes graças pelos seus filhos e filhas! Daí que registamos outra nota (uma graça!) da proximidade entre ambos, conforme o seu testemunho credível: A irmã Adelaide adoeceu gravemente, na véspera do Natal de 1991, com diabetes, entrando em coma diabético a 27 desse mês. Durante a sua permanência no Hospital de Coimbra, o Padre Nunes Pereira, implorando de Deus a sua cura, recorreu ao Servo de Deus Padre Américo!

Padre Manuel Mendes