
MALANJE
Chamou-me da porta, depois do jantar e, com rosto abatido, disse que queria falar-me de algo pessoal. Com um sorriso convido-o a sentar-se numa cadeira e desligo o computador.
Começa: «Pai venho falar porque a mina irmã está muito doente e vive com mina avó, que já é velhinha. E queria pedir autorização para sair de Casa, que me arranjasse algum trabalho, para ganhar dinheiro para as ajudar e estudaria à tarde.» Pergunto-lhe por quem vive na casa da avó e ele continua: «A verdade, é que vivem sozinhas, alguns netos passam por lá durante o dia ou dormem alguns dias, mas depois vão-se embora. Elas são a única família que tenho, para além da Casa do Gaiato. Minha mãe sofria de uma doença que nós chamamos de "santos" e ficava como se não conhecesse ninguém. Eu vi-a morta quando tinha 10 anos. É um sentimento muito forte ver a própria mãe assim e dar-me conta de que nunca mais me poderia abraçar...» lágrimas. Entretanto pergunto se os dois são irmãos de pai e mãe. Responde: «Não, só de mãe, pois a mina mãe uma vez em que se encontrava com essa doença dos "santos", foi violada e daí nasceu a mina irmã. Tenho medo que ela tenha a mesma doença da mãe e temo perdê-la.»
Depois de o deixar desabafar, acerco-me e digo-lhe: «Tu entraste em nossa Obra quando tinhas 11 anos. Um ano depois da morte da tua mãe, e a Casa do Gaiato passou a ser a tua família.» Ele assentiu com a cabeça e continuei: «Então, eu passei a ser o teu pai e tu meu filho»; «Sim Padre Rafa», respondeu. «Então, se tu és meu filho, tua irmã também é minha filha, como família vamos procurar fazer o possível e ver a situação de saúde das duas, e se precisarem de alguma coisa, iremos apoia-las com alimentos e medicação. Mas, sobretudo, deixa de pensar que a tua mãe morreu dessa enfermidade de "santos" e pensa que ela está a cuidar de tudo desde o Céu. Assim, amanhã de manhã iremos juntos visitá-las, que te parece?»... desenhou um ténue sorriso. «Obrigado Padre Rafael, boa noite»... despediu-se.
Quando penso no Património dos Pobres, que temos em Portugal, e vejo tantas necessidades, sonho para que um dia seja uma realidade em Angola.
Padre Rafael