IN MEMORIAM
Em sua Memória relembramos um dos seus primeiros textos n'O GAIATO, n.° 1196 de 13-01-1990, p.6, tão actual nos dias que correm:
«ENCONTROS
Oiço passos apressados no corredor que conduz ao meu quarto. Bate-se à porta mas nem se espera ordem de entrada. Uns cinco miúdos entram e o Evelísio estende-me um pequeno papel que traz na sua mão. Os outros, quase ao mesmo tempo, dizem, com grandes sorrisos, algo que descodifiquei assim: "Foi ele que fez! A senhora professora diz que está muito bem".
Todos fizemos!
- Ela mandou mostrar.
- Está porreiro!
Leio... Eis o que li e agora dou a ler:
"Nós, crianças,
dizemos não à poluição
porque não queremos a destruição!
Não queremos ver
os homens a combater,
os animais a sofrer,
as flores a arder,
o mundo a morrer.
Queremos ajudar
os pássaros do ar a voar,
os peixes do mar a nadar,
as plantas do campo a nascer,
os bichos da terra a crescer,
os jardins a florir
o homem a sorrir.
Nós, crianças, amamos a natureza,
porque queremos a vida!"
Olhei para eles. Esperavam a minha reacção. Um beijo a cada um. Palavras, para quê?!
Não sei se os mestres da escrita classificariam este texto como poesia. Senti que a poesia estava ali, à minha frente, nos olhos daqueles meninos que me olhavam. A poesia esteve presente no seu coração e na sua mente. O sonho percorreu-os. Quanta alegria ver crianças a sonhar!
Isto já se passou, há alguns meses. Guardei o texto na minha secretária, como se guarda um pequeno tesouro ou uma recordação que não queremos perder... Neste momento em que todos nos desejámos um Bom Natal e fizemos votos para o próximo ano, decidi partilhar esta escrita. Uma criança de dez anos não quer ver "o mundo a morrer" mas quer ajudar "o homem a sorrir" e proclama, em tom solene: Nós, as crianças, queremos a vida".
Padre Manuel Cristóvão»