ERA O ANO I, N.º 25
Uma Novidade
Um dos nossos rapazes foi aviar um recado a Lisboa. É verdade. Um gaiato de 14 anos e pouco mais, levou a missão de acompanhar um irmão doente a um Instituto e de caminho, entregou três mensagens em outros tantos Ministérios, — o pequenino mensageiro da nossa obra. Foi documento vivo; prova real; estímulo para outras obras.
Escrevi o itinerário, dei-lhe 300$00, marquei tempo e lugares. O rapaz cumpriu satisfatoriamente. Chegou a casa à noite. Estávamos à ceia. Oh que matinada no refeitório! Todos saíram dos seus lugares irreverentemente, a saber coisas.
A novidade não está na acção do rapaz; qualquer um, de qualquer Estabelecimento congénere, podia fazer o mesmo.
Mandar que ele o faça. Interessa-lo no mandado. Deixa-lo abrir as asas e adejar; - eis a verdadeira novidade. É muito fácil, sim, mas nunca ninguém o fez, ao menos que se saiba. Os ovos de Colombo são raros, mas aparecem.
A gente ensaia, observa e guarda no peito os primeiros voos destas almas, sem esfregar as mãos nem botar foguetes.
A Casa do Gaiato não é nenhuma MÁQUINA DE FAZER SANTOS, como alguém disse, por picardia. Nós estamos aqui para fazer frente às realidades. É impossível que todos os nossos dêem tábua; muitos hão-de dar casqueira. É assim nas famílias bem nascidas. Com mais razão nesta, cujo nascimento foi desgraça, e infância, aborrecimento. É impossível. Aqui há tempos, foi-me dado ir buscar a certa cadeia, com licença do Ministro da Justiça, um rapaz. O Pai estava. Disse-me que tinha em casa mais sete filhos. - Eu, não sei, bom padre, como isto pode acontecer!
Tenho recebido na minha vida muitas cartas de Pais aflitos, algumas com sinais evidentes de lágrimas caídas no papel, tal o amor àquele filho! Pai e filho diante da realidade a viver o mistério do composto humano!
Ora eu também sou "pai", porque sou padre. Já tenho sofrido e estou para sofrer; é a glória da paternidade. Bem sei que não faço santos; pudera eu santificar-me nesta vida que elegi, por graça de Deus. Sei o terreno que piso.
Quando amanhã os jornais disserem ao público o crime de um gaiato, basta encontrar um amigo que me saiba enxugar as lágrimas, como tantas que eu tenho enxugado a Pais e Mães dolorosos; — e caminho para a frente.
Pai Américo