DA NOSSA VIDA
Outras pobrezas
É uma mãe com dois filhos, divorciada. Coube-lhe, na separação, o andar onde vivem, do que tem de pagar a mensalidade ao banco, relativa ao empréstimo antes contraído. Para os custos correntes da habitação e com os filhos, vai esgravatando aqui e acolá, mas com muita dificuldade. A sua meia-idade não facilita a obtenção de trabalho, e o facto de ser proprietária do andar que está a pagar não lhe dá direito ao Rendimento Social.
No início de cada mês, volta sempre a aflição de não ter com que pagar a prestação bancária. Fugir à vida aparece-lhe como a escapatória e solução...
Uma vizinha, que os acompanha, vai estando atenta e puxa-a para vir até nós, confiante. Trocamos algumas palavras, também de confiança, e renovamos a partilha. Durante mais um mês poderá respirar mais livremente.
Outra mãe, a conselho de amiga, vem também procurar-nos. Habita, com seu filho muito deficiente, cuja pensão é o seu rendimento, num andar que herdou dos pais. Tem esta facilidade, que poucos encargos lhe traz. No entanto, é o filho já adulto, de que tem de cuidar diariamente, que a deixa em dificuldades. Levantá-lo, cuidar dele em todas as necessidades, não é tarefa fácil. Por isso, vem esperançosa em que a ajudem a comprar um aparelho que facilitaria a movimentação do filho, especialmente no levantar e deitar. Iremos ainda ver.
Não são situações de pobreza tradicional, mas são situações aflitivas que podem conduzir os envolvidos nelas a decisões por desespero, e este não é bom conselheiro. Quantas mais por esse país fora? São muitíssimas. Que fazer? A resposta dá-a Pai Américo: «A melhor maneira de resolver os males alheios é cada um fazer todo o bem que puder dentro da sua pequenina esfera de acção. Não há arma mais eficaz para combater o Mal do que a prática do Bem».
Hoje vivem, entre nós, novas formas de pobreza, como também é costume elas serem classificadas. Também no que diz respeito às crianças, vêm sendo de há anos a esta parte, cada vez mais aquelas que entram por caminhos classificados oficialmente de risco. Não são mais que crianças que perdem os apoios para o seu equilíbrio emocional, porque lhes faltando o pai ou a mãe ou mesmo ambos, quase sempre pais vivos, inseridos em ambientes agressivos e hostis, entram instintivamente em comportamentos anti-sociais, desviando-se do percurso que as conduziria a uma vida normal e, de igual modo, integrada na sociedade. A maioria dos casos patológicos, a que muitos aludem, estarão na natureza deles?!
Se não se lhes oferecer o ambiente que lhes falta, certamente se perderão. Esse ambiente é o da vida em família, em simultâneo com um ambiente escolar pacífico.
Dentre estes, vamos acolhendo alguns, e muitos mais poderíamos acolher e ajudar a crescer e a fazerem-se homens. Parece que vai aumentando o número dos descontentes com este estado de coisas na vida social, especialmente escolar, mas as opções que se vão tomando, por serem artificiais, nunca atingirão o centro do problema. Só um ambiente familiar e fraterno pode criar confiança e equilíbrio àqueles que tendem a cair na marginalidade.
Padre Júlio