DA NOSSA VIDA

Quero ser padre

Naquele dia 3 de Outubro do ano de 1925, Pai Américo, ainda ao tempo o senhor Américo, modo como o viriam a tratar os seus companheiros do Seminário Maior de Coimbra, começava a concretizar o chamamento interior que o impelia para ser padre. Este era o seu desejo de infância, que nessa fase da vida praticava imitando celebrações religiosas, que levaram os seus irmãos a cognominá-lo de «beato».

Sua mãe, certamente atenta a estas práticas infantis, concordava com o desejo que este filho expressava; seu pai, porém, que talvez não compaginasse a seriedade que essa vocação exigia com o modo de ser do filho que manifestava gosto pelas tradições populares, efusivas da alegria e divertimento que lhes são próprias, não aceitou que Amériquito entrasse pelo caminho que este pedia à mãe, o de ser padre.

Foi preciso esperar que chegasse o mês em que faria 38 anos, para dar início à caminhada de preparação para o sacerdócio ministerial. Foram muitos anos de espera, nos quais se formou humanamente, conheceu a vida do mundo em vários lugares deste, em que fez naturalmente o discernimento do bem e do mal, do que é conveniente ou inconveniente numa vida que se quer próxima de Deus e útil à sociedade dos homens.

Logo nos primeiros contactos com os jovens seminaristas, deu-se um episódio curioso entre Américo e um deles, de nome Raúl Mira, que viria a ser seu colega no sacerdócio ministerial, que no meu início da mesma caminhada mo contou pessoalmente. Encontravam-se no hall de entrada do Seminário. Vendo uma especial personagem vestida de fato claro, traje nada habitual no meio em que se encontravam, dirigiu-se-lhe e quis saber como se chamava. O senhor Américo retribuiu a pergunta: «E você como se chama?». «Raúl Mira», respondeu o jovem seminarista. «Pois eu chamo-me Mira Raúl».

Muito tempo depois, Pai Américo haveria de dizer que via tudo ao contrário, ironizando que talvez fosse dos óculos. Curiosa esta troca na ordem das palavras, uma espécie de premonição da procura da Verdade que se alcança pelo desfazer da ordem estabelecida, passando de uma visão superficial da realidade para uma leitura em profundidade da vida, o que fará de Pai Américo um cristão distinto do comum, cheio de sabedoria.

Cumpre-se agora o Centenário da abertura das portas do Seminário Maior de Coimbra para Américo Monteiro de Aguiar. Fomos celebrá-lo neste local em que, passados 4 anos desse acontecimento, Padre Américo viu, com admiração, cumprido o seu desejo que o acompanhou desde a infância, com maior ou menor consciência, até atingir a idade perto dos quarenta.

Depois dele, vários padres fizeram a sua formação sacerdotal neste Seminário da Igreja de Coimbra, e dedicaram o seu ministério ao serviço da Igreja na Obra da Rua. Por isso mesmo, a esta Diocese e seus responsáveis, na pessoa do seu actual Bispo Dom Virgílio Antunes, manifestamos o nosso agradecimento reconhecido.

Padre Júlio