DA NOSSA VIDA

Curar

Este tempo que vivemos é, claramente, de travessia do deserto. Tempo de prova, de purificação e de confirmação no caminho a seguir que nos leva à terra da promessa; tempo de deixar claros os limites à terra da escravidão, onde domina o pecado, que não é possível se confundam com a terra da liberdade, onde está estabelecido o Bem.

Tempo de prova onde por vezes a confusão domina, quando parece ter-se perdido o norte e tudo mergulhar no mesmo caldo. É quando se repete o grito de Pedro: «Salva-me Senhor!»; e a esperança renasce.

Tempo de resistir e persistir, mesmo que as serpentes mordam e em alguns deixem veneno. Veneno que tira toda a clarividência, ficando toda a realidade reduzida a objectos que se usam indiscriminadamente, indistintamente. Veneno que deixa espaços como que de árvores queimadas, intercalados na floresta verde.

Numeroso como as árvores da floresta, misturado como o trigo e o joio numa seara, o povo faz a sua travessia do deserto sem parar nem se conter pela perseguição de outros. Ainda que de coração doloroso por não conseguir evitar que no seu seio haja escândalos, prossegue o seu caminho de fé, repreendendo e afastando convictamente os que os provocam e amparando os seus membros feridos. Àqueles «melhor seria que lhe atassem ao pescoço uma pedra de moinho e o lançassem ao mar».

A caminhada ainda não chegou ao seu termo. Há que prosseguir.

Tratar

É inquestionável que a pessoa que se encontra doente em dado momento da sua vida é credora de todos os cuidados de que necessita. Ela não é culpada de ter adquirido a doença. Mas também é inquestionável que há pessoas que ficam doentes devido ao meio ambiente em que vivem ou viveram, ou pelo tipo de vida ou usos por que optaram. Ficaram involuntariamente doentes.

A doença pode, para lá de origem física, ter também origem espiritual.

Hoje fala-se de doença por tudo e por nada do que saia do padrão de normalidade. Sendo doença, o que a possui adquire um carácter protecionista e naturalmente desculpabilizante, devendo, por isso, o doente ser integrado na sociedade sem segregações.

Mas a pessoa que está doente tal como a pessoa que está em situação de pobreza têm o dever moral de tratar cada um o seu mal, seja a doença, num caso, seja a pobreza no outro.

Sair destas situações é cada um fazer a sua travessia no deserto.

Padre Júlio