
DA NOSSA VIDA
Animais
O Sérgio é o tratador da nossa «bicharada». Dar a ração aos coelhos, aos porcos, às galinhas e às ovelhas, é a sua principal tarefa diária. Ao seu jeito para tudo isto, acrescenta-se ainda o de mugir as vacas ao Domingo. Tudo isto ele faz com gosto e alegria. No final do dia, antes de se recolher, dá uma última passagem e fecha portas e janelas que poderão ter estado abertas durante o dia para arejar e refrescar as dependências dos animais. Nunca deixa de o fazer, o que para mim, que passo depois dele, é um bálsamo no final de cada dia, saboroso e pacificador do espírito. Nada melhor que o sabor do dever cumprido, a que corresponde a manifestação do interesse pelas coisas e pela vida.
É sabido que o contacto com os animais é pacificador do espírito, favorecendo muito o equilíbrio emocional. É uma verdadeira acção terapêutica em doenças ou perturbações psíquicas, participando este contacto como um factor tendente a equilibrar as tensões desajustadas.
Lembro-me de um Rapaz nosso que passava a maior parte do seu tempo livre junto dos animais na vacaria. Se inicialmente parecia um refúgio ou uma fuga ao convívio com os outros, depressa percebi e mais tarde comprovei que se tratava de um ambiente que o pacificava e o libertava de cargas emocionais muito fortes que lhe pesavam e que trouxera quando chegou até nós.
Esta é uma realidade que não carece de muita investigação, tal a evidência com que se apresenta. Parece mesmo que, para que a sociedade seja constituída por pessoas emocionalmente saudáveis, é necessário que haja um frequente contacto das pessoas com animais. É evidente que muitos optam por ter o seu animal de estimação em casa, especialmente nas cidades, o que, ainda que inconscientemente, vai na mesma linha. À falta de melhores e mais largos horizontes este é por si, um contributo a beneficiar quem dele se serve, desde que não se coloque o animal que se tem por companhia acima do lugar que lhe cabe.
Foi já há oito décadas que Pai Américo intuiu estas verdades como meio privilegiado para recuperar os rapazes abandonados nas ruas. O contacto com a natureza e particularmente com os animais, tornou-se o primeiro sector na vida da Casa do Gaiato que muitíssimos rapazes experimentaram e beneficiaram, do que saíram belas crónicas da pena de Pai Américo registados n'O GAIATO e depois transcritas em livro.
Hoje, outras realidades atraem os mais novos, e não só, que se tornam pouco saudáveis se praticadas em excesso. É mesmo para aí que tendem, dado o carácter viciante que os meios tecnológicos virtuais possuem. Dos mais pequenos aos maiores, todos ocupam os seus tempos livres no dedilhar destas máquinas. É pena, talvez daqui a uns anos venham a precisar da ajuda dos animais para se recomporem da saturação a que certamente chegarão.
Entretanto, o nosso Sérgio, embora tricotando também nas suas máquinas virtuais, não deixa aquilo a que se dá com tanto gosto - o cuidar dos nossos animais.
Padre Júlio