DA NOSSA VIDA

Doença

Apesar de todos sabermos o que é a pobreza, pelo conhecimento mais ou menos intuitivo, por a vermos incarnada num nosso semelhante, por experiência de a ter como opção, fui mesmo assim ao dicionário ver como ele a define. Tomei nota de uma: «Falta do necessário à vida». Entendi aqui como vida um estado em que as várias dimensões humanas se interligam, gerando um estado de equilíbrio no dia presente que tende para um amanhã com confiança. Não basta o hoje para estar vivo, mas é também necessário a confiança no amanhã. Talvez por isso Jesus tenha dito que os mortos sepultem os seus mortos, ou seja, aqueles que vivem só para o hoje.

Quando algo afecta este equilíbrio, esse algo é causa de pobreza. Há, portanto, uma panóplia de causas geradoras de pobreza. Muitas delas estão retratadas no Evangelho. De todas elas a que mais sobressai, na minha modesta leitura, é a doença: Física, psicológica, espiritual... São imensos os que, portadores de uma destas doenças, procuram o Senhor para serem curados. E são-no de facto.

Os Pobres de bens materiais passam despercebidos. Praticamente só sabemos que Jesus os atende porque é referido que Judas Iscariotes levava a bolsa das ofertas que davam a Jesus, e que ele estava incumbido de distribuir ofertas aos Pobres.

Pai Américo, especialmente nos anos em que se assumiu «Recoveiro dos Pobres», atendeu a múltiplas situações de pobreza. A que mais certamente o atingia e feria, era a dos doentes, pois à ausência de bens para viver se juntava a incapacidade para os ganhar e a incapacidade para se cuidarem. O seu último canto amoroso foi-lhes dedicado - O Calvário, onde os doentes levassem a sua cruz, sim, mas sem a arrastar. Coisa que os detractores do Calvário nunca compreenderam nem são capazes de compreender.

Hoje vivemos uma situação generalizada de uma doença difícil de enfrentar, por quem por ela é afectado e por quem o não é. Uns porque a sofrem em si mesmos ou em alguém próximo e querido, outros porque carregam o fardo de a tratar ou evitar. Outros ainda não a enfrentam com realismo, fazendo-o de ânimo leve como se lhe fossem incólumes.

Podemos por tudo isto afirmar que há hoje uma situação de pobreza generalizada. Uma pobreza difícil de aliviar porque muito contagiosa e que carece de meios muito especializados para ser tratada. Uma pobreza geradora de outras pobrezas, que origina desfalecimento e desânimo pelo amanhã.

Quem sofre a doença quer viver. E deve ter confiança no seu viver, porque desfalecer é próprio de quem vive e até de quem confia no amanhã. Este era o ânimo que impelia os Pobres e Doentes a irem ter com Jesus. E, com esta confiança que se chama fé, eram atendidos. Noutras vezes eram os discípulos os actores. A presença de Deus e o labor humano é necessário num agir em uníssono, não um só mas ambos, porque ambos são necessários para a cura desta pobreza.

Padre Júlio