DA NOSSA VIDA

Gratuidade

O Papa Francisco disse publicamente que o dinheiro que origina riqueza desonesta é «esterco do diabo». Já Pai Américo disse algo de equivalente que me dispenso de escrever (também ele não o escreveu, que eu saiba)... Aliás, como contou o nosso Padre Baptista, um dia Pai Américo encontrou um cofre numa casa de banho de uma das nossas Casas e comentou que o mesmo estava no lugar mais indicado...

Apesar deste apontamento, sabemos como Pai Américo dedicou grande parte do seu tempo em busca de dinheiro para as obras que ia edificando. Aquando da construção do Calvário, disse: «Estamos em frente de uma empresa onde o dinheiro é preciso. Muito dinheiro. Milhares... Mas isso não pode ser obstáculo. Nem para a construção nem para a manutenção de centenas de doentes...»

O dinheiro é necessário como um meio para o trabalho em favor da humanidade e das pessoas individualmente. Mas não deve ser um meio para o "belo prazer" ou ganância pessoal ou interesses egoístas de grupo. Deve ser um bem para o serviço da comunidade. Por isso e para isso é necessário. Quando para satisfazer egoísmos desmesurados é esterco e torna-se uma fonte de corrupção, a raiz de todos os males como disse o apóstolo Paulo.

Quando há muito dinheiro, especialmente na mão de quem não o angariou, a iniciativa decresce e definha. Tantas vezes nas famílias em que ele abunda, os filhos tornam-se levianos e meros gastadores. Nas sociedades em que o dinheiro «cai do céu», multiplicam-se os corruptos e só o dinheiro vale. Não admira, por isso, que tudo o que seja gratuidade é desprezado e tido como coisa ridícula e incompetente, já que é coisa escandalosa para os amigos do dinheiro.

O ambiente em que vivemos é exemplo disto. Tendo nós como dinamismo da nossa vida o amor ao serviço generoso e gratuito, fácil é de concluir o lugar em que somos colocados pelos administradores do dinheiro que vai «caindo do céu». Caímos, a seus olhos, no ridículo e etiquetados como incompetentes ou não especialistas. Mas nós insistimos, e acreditamos que a melhor técnica para lidar com os problemas humanos é o amor, parafraseando Pai Américo, nele nascem as melhores e mais felizes iniciativas.

Olhamos o mundo e vemos, como todos podem ver, as carências gritantes de tantas pessoas, particularmente de crianças. Onde podemos, já chegamos há muitos anos, em Angola especialmente, e com eles partilhamos a nossa vida e os bens que vais colocando nas nossas mãos. Mas algumas outras nós também queríamos ajudar e não podemos, pelo que referi atrás e pelas opções de quem governa. É que, muitas vezes, o dinheiro precede a iniciativa, e então fica tudo contaminado. Nesses meios não entramos nem nos deixariam entrar.

Padre Júlio