DA NOSSA VIDA

Crianças

Parecem ter sido dirigidas exclusivamente à humanidade as consequências da epidemia que se espalhou no mundo. Ao contrário do homem, todos os outros seres vivos beneficiaram dos efeitos desta pandemia. O ambiente em geral recuperou na sua "saúde", os animais recuperaram espaços pela ausência do homem, a natureza ficou desafogada sem a pressão exploradora e a avidez pelos seus recursos.

Antigamente, quando uma criança se comportava mal, era ameaçada de ser fechada no seu quarto, às vezes «no quarto escuro». Era tudo tão natural como o contrário. Hoje, esta medida correctiva seria inconcebível, embora em tantas situações se carreguem as crianças com cadeias bem mais duras e difíceis de quebrar.

Pois parece que agora fomos todos, pessoas de todas as idades, que recebemos o castigo de ficarmos fechados em casa, seja qual for o local do planeta onde vivamos. Não podemos dizer que nada fizemos de mal. Se fossemos a elencar as asneiras feitas, não haveria livros que comportassem todas elas.

É provável que haja quem se sinta no direito de fazer tudo o que lhe vem à cabeça. As crianças facilmente agem assim. Seguem os seus impulsos, raramente reflectidos. Também nós já fomos crianças... Por isso é que vinha o castigo de podermos ficar fechados no quarto...

Mas não havia só castigos. Também havia os prémios. Na parte que me toca, não me recordo tanto de os receber, talvez porque mais candidato aos primeiros. Sim, destes lembro-me de muitos... e como eram merecidos. Prémios, merecia-os quem me criou e educou...

Por isso é triste que a maioria das vítimas desta pandemia sejam os que estão na fase final da vida, perto do final de a cumprirem. Quem sabe se não será uma ironia este destino? Antes que lhes retirassem o tapete, como já se ia fazendo por vários lados, e a alastrar!?

Como seria bom que o homem se remetesse à sua grandeza, a ele foi entregue tudo quanto existe, todos os meios para transformar o mundo em proveito de todos, em que o singular é absorvido pelo plural, sem extremismos. Grandes coisas faz o homem, mas algumas são tão grandes que o esmagam.

Parece que, agora, muitas pessoas estão desejosas de regressar ao passado, viver como já viveram. Não era certamente tudo mau, muito de humano corria nas veias da humanidade. Mas, uma simples lição será de colher de tudo o que temos vivido nos últimos meses: Não esquecermos que, no fim de contas, ainda somos como as crianças... Mas também, que «é delas o Reino dos Céus».

Padre Júlio