DA NOSSA VIDA
Obra da Rua
Uma Obra como a nossa, que Pai Américo criou e desenvolveu, não é consequência do pensamento e do cálculo humano; é resultado de um carisma, um dom de Deus.
Sempre se tem falado, especialmente de há umas décadas para cá, sobre a adequação da Obra da Rua aos tempos, porque, de facto, os tempos vão mudando nos seus usos e costumes e mentalidades. Sendo certo que estas mudanças são uma realidade incontestável, é bom não perder de vista o ponto de partida de que, Pai Américo no seu tempo e contexto, teve de suportar desconcordâncias, dentro e fora, que ele esclarecia e rebatia, não só na sociedade civil mas, talvez mais acentuadamente, de membros da própria Igreja, sem A qual ele nada fazia nem queria fazer.
Assim como Pai Américo foi um inovador no serviço dos Pobres - proximidade, comunicação, incarnação - do mesmo modo o foi com os seus filhos - pai, companheiro, advogado. Sem restringir aos Pobres, Pai Américo, usando a expressão do apóstolo, foi «tudo para todos», à imagem do Mestre que ele seguiu a par e passo. Daqui lhe veio o carisma, o dom da Graça, o dom de Deus. Dom por ele convertido em pedagogia e obras, que criaram a identidade da Obra da Rua.
Desde logo a vida em família, a primeira resposta para os problemas dos Pobres e de seus filhos. Vida de família experimentada, e vida de família inspirada no modelo da Família de Nazaré, garante do progresso e crescimento pessoal e social, humanamente e materialmente.
A partilha de vida, nas obras e nos afectos familiares, até ao oferecimento de si mesmo, à imagem do pelicano que faz jorrar o próprio sangue para alimentar os filhos.
Organização da vida prática quotidiana tendo em vista o ponto de crescimento e de maturação em que cada um se encontra.
Com o pensamento projectado no futuro, adquirindo as ferramentas necessárias para, na altura própria, vingar na vida em sociedade, servindo-a.
Enquadramento da vida na sua dimensão sobrenatural, formando o homem espiritual.
Todo este programa de vida implica uma doação total a quem lhe mete ombros. Não se compadece de horários pré-determinados, ainda que folgados, ou interesses pessoais.
Agora, transpondo para os nossos dias: é possível incarnar este carisma, aqui apresentado de forma muito resumida e simples, na sociedade de hoje? Ela, sociedade sem Deus, que não valoriza a família natural, que não valoriza o homem espiritual, que tem na lei a expressão do ideal como forma em que todos se devem moldar! Nela, com uma mentalidade dominante em que prevalece o interesse individual em detrimento do comunitário, em que o serviço só tem sentido se for remunerado, em que a abnegação só é assumida quando traz a possibilidade de um prémio gratificante!
Podíamos escalpelizar mais e mais...
Como Pai Américo dizia, nunca a mãe foi ensinada a dar o peito ao seu filho. E ainda, que, técnico é aquele que ama. São verdades insofismáveis que a vida comprova e o seu oposto também. Mas, como as enquadrar na lei que regula todos os nossos passos? Quem credencia os pais para serem pais e as mães para serem mães e os filhos para serem filhos? Quando o fazem uns e outros(as) são desacreditados e o resultado é aberrante. Ó lei, procura servir em vez de quereres ser servida!
Padre Júlio