CONFERÊNCIA DE PAÇO DE SOUSA

Onde está o meu próximo?

Impressionou-me muito uma notícia que li há dias sobre um caso que ocorreu perto de Houston, no Texas. Num bloco de apartamentos onde viviam outras pessoas foram encontrados três irmãos com 7, 10 e 15 anos, em estado de subalimentação, a viverem com outro irmão que tinha morrido há cerca de um ano e cujo corpo se encontrava em estado de esqueleto. Esta criança morreu porque tinha sido agredida pelo padrasto. Este padrasto e a mãe das crianças viveram algum tempo com a criança morta dentro de casa, mas depois mudaram-se para outro apartamento, abandonando as crianças fechadas em casa, sem mobília e com muito pouco mais.

Parece que era o mais velho que cuidava dos seus irmãos.

Esporadicamente a mãe fazia chegar alguma comida às crianças que viviam assim abandonadas há cerca de 6 meses.

Quem valeu de alguma coisa a estas crianças foi um vizinho que lhes dava comida com alguma regularidade, mas não o género de comida de que as crianças mais precisavam. Também foi este vizinho que carregou o telemóvel das crianças quando foi cortada a electricidade no apartamento. Foi com este telemóvel que o mais velho ligou para o número de emergência lá do sítio (911), farto da situação em que se encontrava com os seus irmãos e depois de perder o medo de represálias que poderiam vir da parte do padrasto.

Onde estava o próximo destas crianças durante todo este tempo até o caso ser descoberto? O próximo destas crianças não foi certamente nem o padrasto, nem a mãe. Também não foram os vizinhos que agora dizem que até tiveram de desligar o ar condicionado por causa do mau cheio que vinha do apartamento onde as crianças viviam. O próximo destas crianças também não foram os responsáveis das escolas onde as crianças andavam e às quais já estavam a faltar há mais de um ano.

Mais uma nota ainda sobre este caso. O padrasto frequentava uma rede social (Instagram) onde colocava mensagens a dizer que gostava muito da sua família.

Por que é que estou a relatar aqui este caso quando ele aconteceu tão longe de nós, do outro lado do mundo?

Padrastos que batem nos seus enteados, às vezes até os levarem à morte, só acontece no Texas?

Maus cheiros que vêm de habitações onde moram pessoas que não conseguem cuidar de si, ou que até já estão mortas há algum tempo sem que ninguém dê por isso, só acontece no Texas?

Pessoas que precisam de uma pequena ajuda como seja carregar um telemóvel, ajuda essa que pode fazer a diferença entre a vida e a morte, só acontece no Texas?

Se não temos memória de que tenha ocorrido por perto um caso com todos os ingredientes do atrás relatado, vários dos seus ingredientes podem acontecer bem perto de nós, no vizinho do lado.

É por isso que organizações como as Conferências Vicentinas são muito precisas. É por isso que nas reuniões da nossa Conferência e certamente nas reuniões das outras Conferências perguntamo-nos sempre se sabemos de casos de alguém que precise de ajuda, mesmo que essa ajuda possa ser "pequena". Se o vizinho que carregou o telemóvel das crianças do Texas não o tivesse feito, talvez hoje essas crianças já estivessem mortas.

Que em todos os dias da nossa vida façamos a pergunta: Onde está o meu próximo?

Américo Mendes