CALVÁRIO

Promovendo o bem comum, a nossa responsabilidade social tem o seu fundamento no gesto criador de Deus, que dá a todos os bens da terra: assim como estes, também os frutos do trabalho do homem devem ser igualmente acessíveis. Com efeito, ajudar os pobres é uma questão de justiça, muito antes de ser uma questão de caridade. Como observa Santo Agostinho: «Damos pão a quem tem fome, mas seria muito melhor que ninguém passasse fome e não precisássemos ser generosos para com ninguém. Damos roupas a quem está nu, mas Deus queira que todos estejam vestidos e que ninguém passe necessidades sobre isto» (Comentário à 1 Jo 8, 5).

MENSAGEM DO SANTO PADRE LEÃO XIV PARA O IX DIA MUNDIAL DOS POBRES,
16 de Novembro de 2025

No Calvário de Beire — Casa do Gaiato, continuamos o nosso esforço de acolhimento de doentes no edifício renovado. Um dos aspectos urgentes é a necessária compaginação de histórias e expectativas. Há membros que estão cá há décadas e há quem tenha chegado recentemente. A convivência tem de ser trabalhada por todos, quer pelos membros quer pelos colaboradores e voluntários. É um desafio permanente compreender os ritmos de vida de cada um e orquestrar todos tendo em conta a vida de comunhão e a vida fraterna. Os feitios e os efeitos de distintas personalidades, não raras vezes, provocam alguma tensão que a aproximação humana de quem está para servir prontamente esclarece. Os gestos de amor cuidam sempre e mais particularmente quando há feridas ocultas. A distância de um familiar que não aparece para uma visita; o agravamento da doença que faz sofrer em silêncio; a impossibilidade e a liberdade de movimentos de outrora criam dificuldades, sem dúvida. A refeição ajuda sempre a saudável convivência, assim como um cafezinho, uma actividade de socialização ou de trabalhos manuais, uma saída à rua, às vezes a ida ao médico gera novos ânimos. É disso que precisamos! Gerar movimento de humanização e crescimento pessoal. Os doentes da Casa não aguardam simplesmente o fim, acolhem o dia-a-dia com a esperança do salmista: «Tu és a minha esperança, ó Senhor Deus» (Sl 71,5); e com perseverança paulina «O Senhor dirija os vossos corações, para que amem a Deus e aguardem Cristo com perseverança (2 Tess 2,16-3,5); com alegria do Papa Francisco; e em tom celebrativo como a eucaristia (diária e dominical), o Terço e a liturgia das horas ricamente expressam.

Temos aceitado quem nos bate à porta, seja com as mãos cheias para dar, seja com as mãos abertas para pedir. Temos procurado acolher todas as situações, embora saibamos que não temos resposta para todas as necessidades no preciso momento em que nos apresentam o caso. Mas fica sempre um contacto, uma necessidade, um desafio a crescer e ser acolhedores. A ser e a fazer diferente, ao modo carismático de Pai Américo, cada pessoa é um tesouro inesgotável de graça. Fazendo-nos pobres, como o Senhor Jesus, enriquecemo-nos e enriquecemos os outros com as virtudes da fé e da caridade, até que a justiça de Deus e da Humanidade brilhe sobre todos. Um trabalho com pobreza de meios e a favor dos pobres, contando com eles, é que pode abrir novos caminhos numa sociedade cada vez mais polarizada entre poucos que têm muito e muitíssimos que não têm nada, a não ser a sua indigência.

Ao termos celebrado cá em Casa o IX Dia Mundial dos Pobres recordamos a intuição do Papa Francisco que pedia atenção e mobilização às instituições da Igreja para trabalharem e corrigirem as causas estruturais que conduzem milhões de seres humanos para a pobreza: alterações climáticas, ausência da fé, abandono das tradições culturais, trabalhos precários, guerra, exploração do trabalho infantil, abusos de poder e outros abusos, divisões familiares, infanticídios, violência contra as mulheres. São tantas as causas…

Que o diálogo que procuramos manter com esta sociedade concreta nos ajude a desenvolver a nossa missão e possamos evangelizar as realidades humanas a partir deste serviço evangélico, para que em todos os âmbitos sociais cada um seja acolhido, tratado e respeitado na sua condição humana ferida e simultaneamente agraciada pelo Amor de Deus.

Padre José Alfredo