CALVÁRIO

Temos, todos nós, procurado tratar bem o Calvário. Os seus membros mais frágeis, os colaboradores, quem nos visita, as instituições com quem nos relacionamos, os amigos e os voluntários. Claro que ficamos sempre aquém das expectativas. O Calvário é um ponto alto, de onde se vê a realidade ornada de perfeição. As décadas de trabalho evangélico silencioso e eficiente pela mão do Padre Baptista e tantos outros benfeitores, como que foram atiradas para as páginas ocultas da história, quando foi necessário intervir na instituição para que ela se actualizasse. E assim acontece. Claro que o silêncio quando é quebrado de forma estrondosa provoca ruído, dissabores; cria obstáculos e preconceitos. Estamos na hora de silenciar o que é preciso silenciar e de falar do que é urgente ser dito e levado a cabo. As mudanças estruturais e orgânicas urgem. Os carismas mantêm-se: um serviço aos doentes; com eles no centro das preocupações; e pelo ritmo deles, como convém para que eles sejam o coração e o centro da vida da casa.

Muitas das vidas que habitam este Calvário conservam os silêncios próprios de histórias humanas difíceis: morte dos progenitores, abandono familiar, violência doméstica, doenças graves, deslocações geográficas e culturais, perda de capacidades e competências cognitivas, pobreza estrutural ou escondida, vergonhas. Faz bem cultivar o silêncio que a natureza adorna com as flores primaveris e o canto das aves em cada manhã.

Mas claro que a nossa vida é activa, não é só contemplação. É preciso cuidar da higiene dos doentes, da sua alimentação e socialização. São tantos os cuidados com cada um que merecem a melhor das atenções dos seus cuidadores. Este é um sinal que nos eleva e remete para o transcendente, porque sinal de bondade e de beleza.

Continuamos no nosso percurso de actualização de processos no Calvário. Acolhimento de novos utentes e reforço dos recursos humanos que mantenham a Casa com vitalidade. Continuamos o nosso esforço de cuidar do património que nos foi legado: arquitectura, jardins, agricultura e pecuária. Refizemos a vinha, replantamos o pomar e estamos a cobrir a avenida da Casa do Gaiato de Beire com kiwis. Num futuro muito próximo queremos iniciar um processo de produção de compotas que represente a contribuição dos doentes para a vida da Casa e seja um projecto económico que ajude à viabilização da instituição… que integre alguma disponibilidade dos membros para esse processo, ainda que seja no cuidado da imagem do produto final… mais não dará certamente.

Vamos continuar a apostar na formação para os nossos colaboradores: suporte básico de vida e cuidados geriátricos; comunicação; espiritualidade em cuidados paliativos; cuidar de quem cuida e autocuidar-se.

São muitos os desafios e é grande a nossa missão. Assim Deus nos dê força para continuar e perseverar, o que nem sempre é fácil. Neste momento estão lançadas as bases para que o Calvário continue a ser um sinal evangélico como sempre foi e consiga estabelecer o diálogo institucional inserido na sociedade portuguesa contemporânea.

Padre José Alfredo