CALVÁRIO

Hoje, 14 de Fevereiro, é dia de Cinzas. Ainda há dias estávamos no tempo de Natal e já a precipitação carnavalesca nos introduziu neste período de purificação espiritual e humana. Mesmo vivendo no Calvário e para o Calvário temos, em cada ano, de fazer este percurso com Jesus: sair da Galileia a caminho da Cidade Santa para daí partir para o Gólgota. Não há como, diz-se em Angola. Não há modo de descarregar o preço da nossa redenção. E fomos salvos por grande preço, disse São Paulo na primeira carta aos Coríntios 6,20.

A liturgia humana e cristã implica esta repetição de gestos e momentos, que não são pura saudade, mas actualização dos grandes nós existenciais que procuramos viver quotidianamente. Aqueles momentos em que tocamos a nossa humanidade e pressentimos a divindade ao nosso lado. É avassalador pensar nisso cada dia!

Esperamos nesta Primavera, finalmente, mudar os nossos doentes para as novas instalações da ERPI. Aguardamos o regresso de alguns doentes que saíram para a reabilitação do edifício. Queremos continuar o nosso esforço de crescimento e adaptação ao tempo e exigências que vivemos. Teremos de considerar mais obras, quer no Lar Residencial, para doentes com múltiplas debilidades, quer na casa mãe, para padres e pessoas que se dedicaram à Obra de forma abnegada.

A 17 de Junho deste ano vamos celebrar e evocar no Coliseu do Porto os 70 anos do anúncio do Pai Américo que iniciava esta epopeia em Beire:


Chegou a hora de dar a notícia de uma Obra que há muito trazemos no peito, a saber: um abrigo onde possam morrer cristãmente legiões de inválidos sem morada certa. Vai-se-lhe dar o nome de Calvário.

Coliseu do Porto, 1954

Gostaríamos de ter presentes muitos e particularmente o Padre Baptista. Foi ele quem pegou nesse anúncio e nos alicerces deixados e edificou toda esta Casa de acolhimento para doentes pobres:


Gostava que a carvalha falasse dos tempos idos, pois muito teria para nos dizer. Ela deixou que um pássaro lhe escavasse um orifício no tronco. Todos os anos ali vem fazer ninho. Já lhe conhecemos os hábitos. Outro dia, a Fátima, na varanda do pavilhão, olha atenta e diz-me: — Eles são com'a gente. Metem o comer na boca dos filhos.

Carvalha Secular, in O Calvário, 2018

No Calvário esperamos o imprevisto. E por isso temos de estar preparados. Como seria bom cuidarmos hoje de quem cuidou no passado! Padre Baptista a Carvalha está preparada e aguarda-o. E doentes e nós também.

Padre José Alfredo