
CALVÁRIO
Um dia as árvores puseram-se a caminho para ungir um rei que reinasse sobre elas. Disseram à oliveira: Reina tu sobre nós! A oliveira respondeu-lhes: Renunciaria eu ao meu azeite que tanto honra aos deuses como aos homens, a fim de balançar-me por sobre as árvores?
Juízes 9, 8-9
A Parábola de Jotão (Juízes 9, 7-21), no contexto da realeza de Abimelec, escolhido como rei pelos cananeus de Siquém, ele que havia morto os seus irmãos para reinar tiranicamente no distante século XIV a.C., entre Canaã e Israel. Sofrerá, todavia, um duro revés e acaba morto e com esse desfecho continua intacta a chave de leitura deuteronomista da história da salvação: só pode haver um rei em Israel e escolhido pelo próprio IHWH, o Senhor dos senhores.
Temos assistido, quer na Europa quer na América, ao aumento da violência, quase gratuita, além de injustificada: seja pela invasão a que Rússia sujeita a Ucrânia, seja pela invasão de fanáticos armados nas escolas, hospitais, centros comerciais e templos religiosos em muitos estados americanos. Iguais manifestações acontecem na América Latina, na África e na Ásia, mas que nem sempre os meios de comunicação nos transmitem.
O poder tornou-se um bem de consumo cada vez mais procurado e desejado. Muitos fazem de tudo, inclusive manipulação de resultados e de pessoas, para chegarem a reinar. Encontram no poder um meio de auto-realização descontrolada e egoísta. É um perigo onde todos nos vemos imersos. Mesmo que não queiramos reinar, podemos ser oprimidos por pessoas comuns, mas com múltiplos tiques imperialistas e autoritários.
Lutar contra este tipo de poder absoluto e individualista significa assumir conscientemente a humildade, como virtude primeiríssima da pessoa humana. Saber olhar o serviço, igual ao do samaritano, como contraponto do poder. Acolher os outros não como meios para os meus fins, mas como fins em si mesmos, que devemos reconhecer e dignificar.
Neste sentido as instituições sociais e, particularmente, as instituições eclesiais desempenham um papel moderador e verdadeiramente formador. Servir as pessoas concretas a partir dessas instituições, fiéis ao espírito do seu fundador, é o exercício de um poder rebaixado, um trabalho simples, um ministério livre de honras e benefícios próprios. Salvaguardando o que é um direito humano e condições indispensáveis mínimas.
As nossas instituições têm o dever e a missão de devolver à sociedade pessoas comprometidas com o bem comum e não converterem-se em locais de refúgio para facilitismos ou para um horizonte de carreira.
Como dizia Pai Américo no Gaiato nº 176 de 1950: não há nada que mais desqualifique o homem do que abusar do seu posto.
Padre José Alfredo