CALVÁRIO

O Zé e o Fernando todas as noites, depois do jantar, esperam que o sr. Abel prepare um dos seus chás, acompanhando-o de algum biscoito. Muitas vezes fico a contemplar como desfrutam desse momento e como o esperam em cada dia...

Há dias, não me apetecia levantar para jantar e apareceu o Zé. Chamou à minha porta e fez-me sair da cama, onde estava recostado, pegou nas muletas enquanto gesticulava com as mãos e descia: «vamos jantar, vamos jantar». E não parou enquanto não me levantei e fui com ele para o refeitório.

A sr.a Julieta está sempre preparada para ajudar em Casa e não se importa com a dificuldade que tem para andar. Recordo um dia em que tive de ir de cadeira de rodas, como ela ajudava o nosso Mário a passá-la por um degrau - só dias depois me dei conta dos problemas que tinha para andar - ou como se preocupa com sr.a Deolinda para não sair à rua.

E assim poderia enumerar tantos momentos onde os doentes do Calvário se convertem num exemplo, para mim, todos os dias. Uma das experiências mais positivas que estou tendo é o ser também cuidado pelos doentes e ver como se cuidam entre eles...

Eu adoraria ver o Calvário novamente aberto, de par-em-par, e preparado para receber dezenas e dezenas de pessoas doentes que não têm onde estar. Sentirem-se acompanhadas, sentirem-se úteis, ajudando-se mutuamente - e algo me diz, no meu interior, que esse tempo não está muito distante.

Hoje, um grupo de rapazes do Calvário saiu a passear até Paço de Sousa, para assistir à apresentação da equipa de futebol deste ano. Na verdade, é uma experiência muito enriquecedora e a vivem como se algum de nós fosse a Paris.

Quanto teremos de desaprender para voltar a aprender...

Padre Rafael