CALVÁRIO

Neste tempo de convalescença que estou passando no Calvário - e onde, dentro das minhas limitações, procuro colaborar enquanto Padre Fernando está em Malanje - tenho muito tempo para pensar, meditar e rezar.

Um Calvário imenso em processo de mudança; renovação ou degradação, cada um julgue segundo a sua consciência. No meu caso, falo como quem está a vivê-lo em sua própria pele. São muitos os dias em que me parece que não faço nada, nem tampouco quero fazer. Enquanto o mundo caminha de um lado para o outro, eu contemplo as árvores - sempre no mesmo lugar.

O coração do Calvário parece bater em outro ritmo... Parece convidar-nos a não nos sentirmos estranhos ou inúteis neste mundo. Muitos dos que aqui estão, parece terem compassado o seu coração por este ritmo. Por isso, o Calvário está vivo e tem seu próprio ser como todo o ser humano - como tudo o que tem vida! O que muda, são os olhos de quem vê... nós fazemos ideias equivocadas e impedimos que sejam eles mesmos.

Durante este mês que aqui estou, unicamente posso dizer que aqui encontrei uma família... uma mais. Onde os poucos doentes que estamos, nos cuidamos, nos acompanhamos. Onde um grupo de pessoas trabalha para que a nossa vida seja mais suportável. Onde outras, muitas, muitíssimas, desde a generosidade do seu coração e da sua oração, se lembram de nós.

Todos os dias, depois da Missa, a Fatinha diz-me: - Venha estar connosco na varanda. Seguramente para estar, simplesmente estar, sem nada que fazer - aprendendo a estar. Sempre que vou do refeitório para o meu quarto, Fernando arranja-me as almofadas para apoiar os pés. Não me pergunta, fá-lo porque lho diz o seu coração. Durante o tempo que vou estar no Calvário, vou procurar fazer algo que é muito difícil para nós - escutar fora; escutar dentro.

Padre Rafael