BENGUELA - VINDE VER!

Viver em Angola hoje

A pandemia da covid-19 veio agravar o nível de vida, já precário, que grande parte das famílias angolanas viviam. As carências são de todos os tipos, tamanhos e latitudes, servindo bem a base de dados para os cálculos estatísticos. O país atravessa uma longa fase de intermitência para poder estabilizar alguma qualidade de vida que seria o reflexo do desenvolvimento social. Há muito moribundo algures, na periferia desta Angola profunda. A dependência económica marcada com o selo de uma economia sustentada em grande escala pela importação, fez surgir pequenos ricos e grandes pobres. Estes últimos da fila muitas vezes sofrendo a exploração dos primeiros. Os que se dizem grandes nesta terra são detentores de algum capital muitas vezes injustificável do ponto de vista da transparência e dos bons hábitos de convivência social saudável para garantir a saúde mental.

A ditadura da fome avança velozmente em direcção a casa das famílias mais carenciadas, lá onde a incerteza de um amanhecer melhor é a única certeza exterminadora da capacidade de construir uma vida diferente. E como um mal não vem só, a seca veio também impor-se, hasteando bem alto o seu rigoroso efeito e o espantoso efeito do aquecimento local crescente. Os campos de cultivo nem chegaram a fazer nascer novos rebentos. O que existia da sementeira do ano passado é insuficiente para alimentar este nosso povo sofredor de longa data; sem poder de compra para aquisição de bens e serviços para o sustento próprio. As sementes são carissimamente comercializadas, fertilizantes e combustíveis mantêm-se na linha da frente, liderando um conjunto de consequências impactantes para a previsão de um tempo de prosperidade onde se pudesse esperar o sucesso na próxima campanha agrícola. O pouco dinheiro que se possa ter mãos voa logo para a posse do comerciante. Compras e vendas; quem tem vende caro. Ruas dando algum trabalho aos pedintes: braços estendidos para receber qualquer coisa que o bom samaritano tenha para o oferecer.

Cresce assustadoramente o número de crianças que vivem na rua. Os espaços para o acolhimento estão sem vagas. Os jovens desempregados procuram emprego dizem: o que dá pra fazer? E muitas vezes a maneira de sobrevivência é delinquência armada e perigosa para a convivência social. Mas também que convivência? Sem pão e esperança, não dá nada, não tem jeito.

Os preços são astronómicos, sobem, sobem até ao alto. Cada vez mais alto. Não param de subir, nem descem para o alcance do bolso da gente que tem poucos recursos financeiros. 

As fronteiras encerradas. Nem possibilidade para ao menos fugir deste contexto, que penso dever ser a última coisa que um filho faça, abandonar a sua querida terra mãe. Só por necessidades extremas: saúde, segurança, formação. Os nossos motores para puxar a água que rega os campos estão quase sempre na conserta. A fragilidade das peças em substituição, a perícia do técnico e o descuido dos operadores, tudo isto faz pagar uma factura muito cara. A conclusão é de Pai Américo: «eu acho que não há pedagogia mais santa do que esta de deixar que os rapazes das nossas casas ardam e iluminem. a multidão dos nossos pecados cobre-se com a esmola dada a tempo e horas».

Padre Quim