BENGUELA - VINDE VER!

O nosso caminho

Já são sessenta e um anos desde a fundação da Casa do Gaiato de Benguela. Os tempos são outros. Sabem o caminho trilhado todos os rapazes daquela primeira hora em ambiente familiar mais alargado. Um Padre a dirigir o leme e na barca cento e tantos rapazes. Outro contexto histórico e social desta então Província Portuguesa. A família continua em pé, os princípios educativos inalteráveis, sólida comunhão de fraternidade entre os rapazes deste e do outro tempo. Os mais novos chamam aos gaiatos antigos "mano", tratamento respeitoso por se reconhecer o sentimento de irmandade. Estes "manos" hoje homens formados, e colaboradores da construção do desenvolvimento do país. Eram os "batatinhas" daquele tempo. Fizeram valer a nossa bandeira, "Obra de rapazes, para rapazes e pelos rapazes". Cada rapaz um sonho nas mãos para se realizar. Uma esperança, uma certeza; fazer de cada rapaz um homem. Hoje o «Casimiro» é o nosso mais pequenino, tem 6 anos de idade, veio pela mão das irmãs do Santíssimo Salvador. Todos os anos recebemos um grupo que vem deste berçário. Muito ainda está para ser feito na estrada da vida destes filhos acolhidos hoje para serem membros desta grande família. A escola, as oficinas, a capela, são algumas áreas incontornáveis de transitar nesta estrada de educação para vida. Oh! Trajectória de continuidade na sublime missão de elevar o capital humano à mais pura dignidade. A barca navega em alto mar. Jesus vai connosco e nos acalma a tempestade dos dias menos alegres e muito carregados de nuvens, fazendo vir sol que irradia a confiança e a estabilidade da barca. E o caminho continua.

Os desafios são de hora em hora. Quando se tem ouvidos para o grito dos pobres nunca nos sentimos ensurdecidos. O nosso coração se alarga para acolher a todos, quer dar espaço, voz e vez àqueles que não as têm. A caridade em acção impulsiona todo o ser da pessoa a ir ao encontro de Cristo que nos leva a compreender a sua presença no meio dos pobres e necessitados.

Todos os dias recebemos à porta do nosso escritório pessoas que se deslocam de várias paragens do país para virem solicitar um lugar para internar uma, duas, três ou quatro crianças em muitos casos. São provenientes de famílias muito carenciadas, muitas delas já sem esperança para um novo dia risonho. A incapacidade financeira para adquirir os bens e serviços que lhes fazem falta está na base da busca de soluções junto da nossa Casa.

Nestes dois últimos anos abrimos a porta para dezenas e dezenas de crianças carenciadas, e com esta abertura vieram inúmeras preocupações que exigem pronta actuação. Arranjar alimentos para sustentar diariamente toda a gente que temos em Casa, pelas quantidades que são consumidas em cada uma das quatro refeições; pequeno-almoço, almoço, lanche no fim das aulas e dos trabalhos e jantar. Valemo-nos do campo agrícola para produção do milho, do feijão em época fria, da banana, da batata-doce, da cebola, do tomate em época própria devido às altas temperaturas que se fazem sentir durante oito meses do ano, aqui na zona litoral que abrange a zona da nossa Aldeia. Durante os meses de forte calor não conseguimos produzir grande parte destes produtos. Ficamos apenas à espera da época fria. Facto que nos leva a procurar muitos destes produtos nos mercados. Os elevados preços dos produtos da cesta básica diária arruínam as poucas economias monetárias que nos chegam de esmola, das mãos dos nossos mui queridos benfeitores locais e sobretudo de Portugal.

A esta hora que escrevo penso numa possível solução: teríamos a situação quase resolvida com uma ajuda para implementação de uma estufa para produzir fora de época os produtos de que nos fazem falta e que não conseguimos ter em alturas mais quentes. A agricultura é uma aposta certa para o desenvolvimento. Os custos com o cuidado e a assistência médica e medicamentosa. Este é o nosso caminho, faz como tantos outros, só caminhando se chega lá.

A conclusão é de Pai Américo «[…] Educando a criança como ela deveria sê-lo em sua casa, no seu meio, dentro das possibilidades da família. A Obra deve girar nos moldes da Família enquanto o miúdo lhe não puder ser restituído. E se este a não tiver, há-de sair do Ninho capaz de a construir, pela prática que teve dela. A Casa do Gaiato é uma Obra eminentemente social e familiar.»

Padre Quim