BEIRE

Encostar-se na ignorância do problema...

PECADOS DE OMISSÃO... Escrever "como quem reza" (Pai Américo) ou "em serviço do povo mais oprimido" (Gandhi) é uma arte que sempre invejei. Porque, desde muito cedo, intuía ser este o caminho que deveria seguir. Como uma "arte literária" e uma "arte divina". Em que nunca se é suficientemente mestre. E que não deveriam nunca andar muito afastadas uma da outra. Pai Américo e Gandhi foram grandes, de uma estatura que ainda hoje nos impressiona (um santo e outro mahatma - alma grande). Porque souberam ligar uma "arte" à outra. Cada um fiel às suas circunstâncias - de tempo e de lugar.

Gosto de viajar em transporte público, porque assim posso ler, escrever e contar... E, se ainda o não tiver lido todo, gosto de levar comigo O GAIATO. Ele continua a fazer bem a muita gente. A começar por mim. Pela partilha das experiências vivenciadas dos seus Padres, colaboradores e dos seus leitores. Também pelo lugar que me dá para partilhar-me convosco. Nesta experiência divinal, vivenciada aqui no Calvário em terreno propício para poder deixar-me sentir na pele a "verdade real" que a parábola d'O Trigo e o Joio (Mt 13, 24-30) nos põe por diante. Como filhos de Adão - bons e maus (Abel e Caim); e filhos de Noé - maus e bons (Cam e Sem).

Tudo como dantes. Bons e maus / maus e bons. Mas nós, armados em juízes, levados não sei por que fraqueza, gostamos de separar - o trigo do joio; os bons de um lado e os maus do outro... Contra a Palavra do Mestre que sempre nos diz para não nos precipitarmos; para deixar crescer juntos até que... Sinto-me dividido. Por um lado o mistério desta fome de amar, deixar-me amar e tudo pôr em amor; por outro lado e ao mesmo tempo, tantos entraves que também eu ponho ao amor. Nas difíceis relações intra e interpessoais - doentes, rapazes, voluntários/as e demais pessoal que recebe salário. Fácil é deixar correr. Como se nada fosse connosco. Mas é connosco. Mexe em nós. Porque o mundo não é de quem o governa, mas de quem o ama.

Urge-me é aprender a amarmo-nos uns aos outros. Neste difícil PRO+cesso de aprender a SER. Porque pregar o "mandamento novo" é-me fácil. Só que: Ninguém aprende a amar por mandamento... Só por ensaio e erro, como quase toda a aprendizagem humana. Mas acredito que ainda posso aprender. Encontro-me aqui num bom campo de treino...

Desta feita, n'O GAIATO de 18 de março, n.º 1905, o P.e Acílio - Património dos Pobres - volta a merecer-me um lugar especial. Aquela cena ali relatada, com aquela maneira de terminar, na pág. 4, ficou-me a picar como um aguilhão: "Toda a gente se encosta na ignorância destes problemas pensando que tudo está remediado. São pecados de omissão de que nem sequer temos consciência".

A INTELIGÊNCIA E A VONTADE. Pego naquele "toda a gente se encosta" e vou até uma carta que, em tempos recebi de P.e Baptista - "... Nós, os padres, também precisamos de ajuda". Porque, na sequência dos ataques à Casa Pia, também andavam no ar os ataques à Obra, o que então percebi do seu "precisamos de ajuda" foi escrever umas coisinhas a defender a Obra da Rua. E, nesse então, fiquei-me por aí. Mais tarde, P.e Baptista voltou ao ataque e pediu-me uma intervenção, numa mesa redonda sobre Pai Américo (Casa Diocesana, Junho 2013). A partir daí, naquele COM+versar difícil em que somos mestres, fui-me apercebendo que aquele grito de alma me chamava mais longe. Passei a visitar o Calvário e a Casa dos Rapazes com alguma frequência. Fui-me apercebendo das necessidades de um Padre da Rua. Mal sabia eu o que A VIDA me estava a pedir. Muito menos sabia ao que, agora já dois anos depois, disse sim. Mas sinto que A VIDA CONTINUA...

Porque acredito que, nós humanos, somos mesmo seres de ajuda - a precisar de ajudar e de sermos ajudados. Obrigado, P.e Baptista pelos desafios que me tem feito. O Projecto Humanizador do Pai tocou-o a si. Já lá vão 80 e tais, P.e Baptista começou a aprender a dizer SIM. Como Maria. Como José. Como Jesus. Como milhões de seguidores Seus. E eu, um bocadinho mais novo e menos generoso, comecei a sonhar sonhos que, vindos de Pai Américo, iam chegando a mim saídos da caneta que a sua mão manejava, conduzida pelo último sonho de Pai Américo. E cá estamos juntos. Pelo sonho é que vamos...

A nível da inteligência, eu sei que "a omissão é o acto destrutivo mais poderoso". E também sei que "o que não se torna consciente vira destino". E também sei que inventamos "carmas" e "destinos" e "vontade de Deus" e outras mentiras que nos tornam mestres na arte de nos enganarmos a nós mesmos... Só para apaziguarmos a nossa consciência mal formada. Anestesiando-a frente à dura verdade real.

Sei. E até quero mudar-me. A nível da inteligência. Mas a nível da vontade de mudar-me, tá quieto... Aí a coisa pia mais fino. É que o comprometer-me faz doer. É-me mais fácil não ver, não pensar, não ligar, Enfim, se calhar, ainda não quero mesmo. Esta é a minha verdade real. Mas já em vias de conversão...

Um admirador