BEIRE - Flash's

A «unidade» era o seu «distintivo»...

1. DEScobrir os Sinais escondidos… É a 5ª feira da VII semana da Páscoa. Rolo na autoestrada, descontraidamente, a saborear a bênção do ainda poder conduzir sozinho. Munido, claro está, da segurança que, sobretudo nesta idade, o bom senso mais recomenda. Naquela curva de (…?), dou-me conta de que, ali, há uma sinalética — um sinal!… Não pude certificar-me se era alguma informação útil ou algum aviso de que (…?). A ramagem que, das árvores à volta, cresceu sobre a sinalética, não deixa apanhar a mensagem que dali se quer dar-nos.

Porque ainda vivo numa de paixão pela Obra da Rua(1)/ Calvário, logo deixo para trás a tal sinalética e… Todo eu me fico a ruminar a esperança de uma realidade de sonhos meus que gostaria de ainda ver cumprirem(-se). Salto, pois, da autoestrada para o Calvário, onde Deus / a Vida / o Amor ainda me chamam. Assim o acredito. Nesta minha fé que, se bem alimentada, não se me esfria…

Lembro a perícope do Evangelho de hoje — a chamada «oração sacerdotal de Jesus» (Jo 17). Detenho-me nos versículos 20-26 — «Não Te peço só por eles [Apóstolos], ó Pai. Também Te peço por aqueles que acreditam em Mim, porque Me conheceram através da palavra deles. Peço-Te que todos sejamos UM, como Tu e Eu somos UM — Eu em Ti, Tu em Mim, e todos eles em Nós». Com isto em mente, vou parar ao «sinal», ao «distintivo» que, nas primeiras comunidades cristãs, teve aquela força avassaladora que mudou todo o percurso da História Ocidental num «antes de Cristo» (a.C.) e num «depois de Cristo» (d.C.). Um «sinal» que até está relatado nos Atos dos Apóstolos. Ouço aquele vede como eles se amam! Fico-me a ruminar o «vede!» É um argumento muito forte.

Quer dizer que a qualidade das relações interpessoais dentro daquela(s) comunidade(s) era o seu distintivo. O sinal da sua identidade…

2. Perfurar o «espírito de Pai Américo»Desde muito cedo, me habituei a ver Pai Américo como um «apaixonado» pelo «Deus Escondido» — por detrás dos filhos da rua, essa perigosa escola do crime… Foi como se eu próprio me visse aí retratado — mesmo tendo a sorte de nascer numa família numerosa e unida. Mas onde sempre ouvia dizer, com tristeza, que «um pobre não pode dar o ser a um filho(2)». E fui-me apercebendo o que era isso de «dar o ser»a um filho e que tal impossibilidade o era, muitas vezes, só por falta de 'meios económicos'. Depois percebi a importância também dos 'meios humanos'. Foi o bastante para sonhar um mundo em que um tal destino jamais caísse sobre ninguém. Sonhava e ainda sonho…

Hoje, sinto-me seduzido pela tarefa de aprender a perfurar o segredo d'isso que dizemos ser «o espírito de Pai Américo». Pelo que agora entendo, era intensa a sua conexão ao Espírito que o vivificava. E que, em matéria social, o levou a fazer a tradução que ele fez do Evangelho, no aqui e agora, das décadas de 40 / 50 do séc. XX. Neste «cantinho à beira mar plantado» mas, já então, a correr riscos de virar enxovalho de oportunistas…

Deixo-me tocar por um comentário ao Evangelho deste dia — «O público para quem foi escrito o (supra citado) evangelho de João já não eram os que tinham ouvido nem a Jesus nem aos Apóstolos. Eram os que tinham acreditado na palavra deles. Mas continuavam fiéis ao mesmo objetivo que os movia — manter a unidade entre eles, com Jesus e com Deus».

Prosseguindo, o comentarista continua: «Os que vierem depois, não poderão estar desfasados desta unidade. Porque também eles precisarão de entrar nesta dinâmica da única Vida — essa de que todos somos parte integrante, num Deus que é "Pai e Senhor dos vivos e dos mortos»… Precisamos, porque todos corremos o risco de nos instalarmos, julgando que já «tudo está no seu lugar».

Ouço um testemunho de P.e Baptista, já nos seus 95 anos, único sobrevivente dos Padres da Rua que privaram com Pai Américo. Foi numa entrevista ao Prof. Dr. Henrique Manuel, já registada em livro. Vale a pena saborear. Num estilo que lhe é tão característico, Pe. Baptista fala dessa fome de unidade que os Padres da Rua vivenciavam, naquele período difícil, logo depois da inesperada morte de Pai Américo. Foi o segredo daquele prosseguir que os trouxe até hoje. Aliás, também esse tema merece destaque na apresentação que Pe. Júlio faz do livro de Pe. Horácio (crónicas escolhidas). Ao recordamos os 25 anos da sua partida para o Pai, sabe bem tornar isso presente.

3. Porque (…) todos o desejamos… «Ser um com o Pai. Um com Jesus. Um com os irmãos». Este foi o desejo consciente e testemunhado por Jesus de Nazaré. E é este o desejo de todos nós — ainda que inconscientes disso e nem sempre manifestado. Porque, mesmo escondido pela «ramagem» do corre-corre do nosso quotidiano, o «sinal», o «distintivo», continua a interpelar-nos. Todos desejamos essa harmonia, essa paz interior que a verdadeira «unidade» sempre nos traz.

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1. O Calvário da Obra da Rua precisa de, não, nem, nunca, jamais, em tempo algum, pertencer à «vulgaridade das ERPI semelhantes»…

2. «Dar o ser!». Isto é dar condições materiais e humanas para que o ser relativo de cada um possa desabrochar-se na fidelidade ao Ser Absoluto — fonte e alimento de todo o ser criado.

Um admirador

[Escreve segundo o acordo ortográfico]