
BEIRE - Flash's
Trago um sonho comigo...
1. A caminho do Hospital P.e Américo. Vou na ambulância dos Bombeiros - transporte de doentes não urgentes. Estou como acompanhante de uma das nossas doentes que tem consulta agendada. Porque é uma tarefa que me é solicitada muitas vezes, vou tranquilo, como que já em família... Livre para pensar e sonhar. Consciente de que 'sem sonhos e aventura, a vida esclerotiza-se'...
Bom. Por muitas e variadas razões, lá estou eu de volta dos meus sonhos... Até porque, para determinadas tarefas do acompanhante de uma senhora, é de toda a conveniência ser uma senhora a acompanhar outra senhora, etc e tal. Deixo-me habitar pelo sonho - um voluntariado mais amplo e bem organizado. De preferência, com uma gestão própria e bem enquadrada na gestão da Casa. Com capacidade para responder às tantas vezes frequentes necessidades de ter alguém para levar e/ou acompanhar os que precisam ir a um Hospital, a uma Clínica, a um Centro de Saúde, ... E não só. Porque não podemos ter pessoal assalariado para tanto inesperado numa Casa como esta. Ainda em vias de crescimento. Além do mais, não há verba que aguente. Porque pessoal subaproveitado - só para eventuais necessidades - estorva muito e cria muitos sarilhos.
Sonho. Que boas recordações eu guardo daquelas vezes em que, ao chegar com o/a doente, já lá tinha um/a voluntário/a à minha espera, para 'tomar conta da tarefa' e..., enquanto eu vou estacionar ou me venho embora, para outros afazeres que urgem. E, depois, a seu tempo, recebo o telefonema a dizer que já estamos prontos, pode... Recordo a segurança sentida a 1ª vez ao chegar com P.e Telmo ao HSJ, no Porto. Tinha ali à porta a D.ra Graça, já à nossa espera. Ela, que eu sabia sentir-se ali peixe na água, porque trabalhou lá tantos anos e lá viveu um mundo de experiências mágicas. De autêntica mística da proximidade. Com doentes terminais da SIDA e/ou do mundo dos sem abrigo. Recordei o que tantas vezes ouvi sobre igual serviço que nos prestava a D.ra Maria dos Anjos - uma referência no voluntariado do Calvário. E as vezes em que, no HPA - Penafiel, tinha outra voluntária, da velha e da nova guarda, a D. Fernanda, mesmo vizinha do Hospital, já à espera. Pronta para pegar no/a doente, saber acompanhá-lo naquele labirinto, enquanto eu arrumo o carro e, depois, vou lá ter, a vê-la ir-se embora, feliz porque se sentiu verdadeiramente útil, a colaborar para o conforto de um doente e apoio a uma instituição que lhe merece todo o respeito, admiração e carinho. São lições a aprender, sonhos a concretizar. Quem quer botar a mão para pormos a máquina em andamento ?!...
2. Um telefonema do Quim Vieira... Ainda no últim'O Gaiato, vos falei aqui de uma tarde, com o casal Quim e Lala, a limpar ervas daninhas, na horta e afins. Lembro que, nessa altura, partilhei com eles este meu sonho: ter uma Bolsa de Voluntários a quem se pudesse telefonar e/ou eles mesmos passassem por aqui regularmente a ver de necessidades. Pois acontece que, no mesmo dia em que fui na ambulância como acompanhante, recebo um telefonema do Quim nestes termos: Ó doutor, hoje o tempo está fresco e nós arranjamos mais uns três ou quatro voluntários e podemos ir aí esta tarde aliviar os mimos da horta, que já deve estar outra vez a precisar. Ligo ao Marcelo, o jovem manda-chuva da zona agrícola, falo da bênção Quim/Lala e seus discípulos. Pergunto sobre que áreas estarão a precisar mais. - Oh!, vêm mesmo a calhar! Mas se eles, em vez de irem para as ervas, pudessem dar uma ajuda na cozinha dos rapazes... É que estamos a arrancar as cebolas e aparecem muitas impróprias para guardar, mas que podem ser aproveitadas se.... É tudo riqueza que fica para se ir gastando.
Tudo a postos, cada com sua faca, lá chegam eles - o casal, uma cunhada e mais uma sobrinha, a Paula, filha do cantor, gaiato, João de Setúbal que, com o Quim, o Júlio, o João Evangelista..., e suas esposas, podem e devem ser contados entre os nossos heróis de África... Não pude acompanhá-los como queria, mas, porque se trata de gente já calhada nestas lides, no final do dia sentir-me a dar graças pelo trabalho que realizaram. Fiquei a sonhar por mais e melhor: Era disto que nós precisávamos - de forma mais ampla e organizada.
São tantas as áreas a precisar de voluntários capazes! Com raízes fundas. Originais. Sem mesclas de fraca fotocópia. São tantas as áreas! E são tantas as pessoas que precisam descobrir as bênçãos do voluntariado. Como resposta milagrosa para tantos males do coração. Porque, quando Florbela Espanca gemeu o celebrado "que pena não haver manicómios para o coração, porque para a cabeça já há muitos", não havia ainda o Calvário... Penso que, se ela vivesse hoje, nos viesse conhecer e arriscasse estar-com+nosco, em tempo e medida q.b., poderia descobrir o segredo. E não duvido: Florbela faria novos versos a cantar a doce DES+coberta dos fantásticos 'manicómios para o coração'...
Um admirador