
BEIRE
O Dia da Mãe, no Calvário...
1. - ... P.e Telmo foi/é meu Pai e Mãe! Já aqui se disse que 'o Adão é um nosso gaiato de Malanje. Foi lá acolhido em pequenino. Criou-se connosco. Hoje, estuda teologia na Universidade Católica e vive no Seminário Maior do Porto, a preparar-se para ser 'Padre da Rua'. Os fins de semana são passados na Casa do Gaiato de Paço de Sousa - Casa Mãe da Obra da Rua - mas sempre que pode, vem ao Calvário - para estar com pai Telmo, ver os rapazes e os doentes. Todos gostamos destas visitas. Simples, sorri - dentes a brilhar num rosto negro. Sempre pronto a dar mão no que for preciso, o Adão sabe gerar proximidade. A sua alegria é contagiante e sente-se nele o gosto por aprender. Bom aprendiz de ouvinte - virtude rara, nos tempos que correm...
P.e Alfredo, que foi Reitor do Seminário Maior do Porto, sabe de caminhos a escavar para, ao chegar à meta (ordenação sacerdotal), não se deixar ofuscar... Porque a ordenação sacerdotal não é uma meta. Isso é uma metáfora... Quando muito é uma etapa que reconhece ao atleta aquela preparação exigida para recomeçar um outro caminho. Com novas exigências de maior perícia no manejo dos três grandes instrumentos que o Senhor da Vida/Vinha (Mt 20) pôs à disposição dos seus trabalhadores - para chegarem a bom porto, na missão que lhes é confiada - a inteligência, a vontade e a liberdade.
Aproveitando a coincidência da presença do Adão, o final da Semana das Vocações e o Dia da Mãe, P.e Alfredo desafia o Adão a 'fazer a homilia'... Dizer-nos o que foi, no Seminário, a Semana das Vocações. Dizer-nos que significado tem o Dia da Mãe. Para ele - um gaiato africano, a viver entre nós...
Bonito o que aconteceu. Em sua alva de acólito, o Adão aproxima-se do ambão. Olhando a assembleia com toda a calma, começa a dizer-nos a sua experiência no Seminário e, chegado ao momento Mãe, comoveu-nos a todos com o que hoje vê. - A grande bênção da minha vida é ter encontrado P.e Telmo. Ele soube ser para mim um pai e uma mãe.
Percebo melhor todo o respeito e amor que... Como é próprio de um bom filho, também gerado na dor - no bonito dizer de Pai Américo.
2. Apanhado no lixo para virar 'luxo'... Tou a ver o entusiasmo do Adão ao mostrar-me a revista juvenil Audácia, de Abril, 21. - Traz aqui um artigo que... Penso que pode até servir-lhe para uma sua crónica. Lembro coisas que ouvia - se estivesse aqui o Abel, tínhamos uma crónica que... Sempre sobre coisas que todos vemos, ouvimos e lemos e... Impõe-se-me o não podemos ignorar. Porque me tocam o coração. Treino em passar para o papel aquilo que, entrando pelos olhos e ouvidos... É. Da cabeça para o coração - o caminho mais longo do mundo. Depois, do coração para o papel...
Trata-se de uma "orquestra de instrumentos reciclados", a deliciar os ouvidos, os olhos e, sobretudo o coração de quem acredita que também as pessoas podem precisar e merecem ser "recicladas"... A coisa está a acontecer em Cateura, no Paraguai - num bairro de lata construído sobre um aterro... Gente sábia, em quem palpita um coração de mãe, gente dessa que vê com os olhos do coração, decide fazer instrumentos com o lixo e um professor de música, desses que sabem que a música é a linguagem dos anjos, começa a ensinar as crianças a tocarem os diversos instrumentos feitos de lixo... Hoje, sentem-se pessoas queridas, aceites, admiradas, importantes na comunidade onde se foram integrando - como membros reconhecidos como uma mais-valia, numa orquestra original, com "instrumentos reciclados"...
Gostei que o Adão me levasse até à revista. Gostei de mastigar o relato do que está a acontecer lá longe, no bairro de Cateura - Paraguai. Gente que, se calhar também foi reciclada, está agora a reciclar lixo e ajudar a reciclar tantas pessoas atiradas para o lixo das ruas e da marginalização. Lembro a tese de Pai Américo: É mais barato prevenir crimes do que suportar criminosos. Olho o Adão. Olho o nosso já Padre Quim. Saído também de Malanje, tem aos ombros a Casa do Gaiato de Benguela. Milagres de que só o Amor Firme é capaz.
3. - Uma mãe?!... Quatro ou cinco!... Foi numa hora de aperto, ali na casa da hortaliça. Era um fim de tarde - dessas semanas em que tinha havido Banco Alimentar, Armazéns Pinto, Intermarché e Lidl. Para além do que o nosso Pessoal da Horta nos brindou, para fim de semana. Uma abundância de quantidade e qualidade. Deus louvado. Uma assalariada, coração de mãe, ao ver a nossa aflição - aproveitar e arrumar antes que... - apareceu a botar uma mãozinha. Agradecido, deixei sair a minha ladainha - estão a ver porque falo tanto na falta de uma mãe?!... Resposta imediata: - Uma?!... Quatro ou cinco!...
No Dia da Mãe, preparando o terreno para a homilia do Adão, P.e Alfredo referiu alguns nomes, ali presentes, como de 'mãe do Calvário'. Gostei de ver proclamada esta verdade. O que nos tem valido são estas assalariadas e/ou voluntárias que... Vi como ficaram contentes. Um Calvário - palavra tirada do Evangelho - não é de quem o governa. É de quem o ama. Por pensamentos, palavras, actos e omissões.
Um admirador