BEIRE
Flashs da quinzena!...
A paciência tudo alcança!... Levantei-me cedo. Como que para acordar a madrugada. Já à luz dos primeiros rosicleres da aurora, estava atarefado a desenvasar umas plantas de estimação - da família das medicinais e culinárias. Num canteirinho, mesmo ali em frente à cozinha. Porque é uma mulher toda desembaraçada, ela também gosta de levantar cedo. Chega e mete conversa. Coisa que faz sempre que a vida lhe oferece uma oportunidade1. Precisa de falar e tem sempre conversa. De um modo geral, é assim que procedem todos os nossos doentes e rapazes. Leio: Por mais doentes que os classifiquemos, todos eles são "verdadeiramente humanos"2. Também neles "a alma é sempre perfeita". Por isso mesmo, como qualquer de nós, têm necessidade de atenção numa média de três horas dia. Sob pena de entrar em cena o seu desequilíbrio emocional.
Hoje, porque estou bem dormido, bem brincado e bem amado, sinto-me particularmente feliz. Assim, longe de ver a presença dela como mais um chato que me vem estorvar no trabalho que urge, sinto-me "instrumento da Sua paz" junto d'aquela irmã nossa, marcada pela doença - física e emocional. Mais: sinto-me reconhecido pela oportunidade que me dá de poder ser útil e agradável a alguém - uma aspiração profunda de qualquer pessoa sadia.
Porque é d'aqueles/as doentes que, quando estão para aí virados/as, gostam mesmo de ajudar nos trabalhos da Casa, explico como funciona o "sistema de rega" destas e de outras plantas que embelezam e enriquecem o ambiente desta Casa de Família para os sem família. As interrupções à minha explicação são constantes. Sempre com o clássico eu-sei-eu-sei, muitas vezes seguido de longas descrições do que faz e não faz, quando e onde. Tento saber ouvir e treino-me na arte de estar-com eles, mesmo quando põem à prova a minha capacidade de aguentar sem perder a paciência... - Sabe, eu gosto muito de regar. Todos os dias eu rego. Enumera plantas dali e dacolá e dacoli. - Quando a doutora está no escritório, eu vou ao quarto de banho dela e rego tudo. Assim, a água fica mais perto...
Enquanto fala, olha-me fixamente nos olhos. Como que a pedir aprovação do que faz e/ou deixa de fazer. Dentro de mim há aquela lutazinha que todos conhecemos bem em circunstâncias tais - dar-lhes vez e voz (todos precisamos d'ISSO!) e o travar o explodir do meu tanto que fazer e com direito/dever a também ter vez e voz...
Satisfeitas minimamente as nossas necessidades de atenção, deixo-a ir e fui também tratar da vida, a outros níveis. Porque os dois - ela por um lado e eu por outro - sempre andamos muito atarefados, fui cuidar das minhas paixões de campo, em com+UNI+ão com nossa Mãe Terra.
Salta-me o Orar com Santa Teresa - a Grande, a de Ávila - de quem sou particularmente devoto. E cujas pegadas (huellas!...) percorri a quando do quinto centenário da sua morte, integrado na XX exposição Las Edades del Hombre - 2015. "A paciência tudo alcança". Mais: "... no hay amor fino sin la paciencia"...
De Santa Teresa passei ao nosso Voluntariado. O que já está mai-lo que é preciso que venha. Gente consciente de que, para ser "voluntário do/no Calvário de Beire", é preciso ser alguém que goste de treinar o sentir-se em PRO+cesso de tornar-se uma pessoa paciente e de muita misericórdia... Para com os doentes, os rapazes, os assalariados e, mais ainda, para com todos e cada um de nós - pobres aprendizes de voluntariado neste tipo de instituições. Que não são meras respostas de acção e/ou segurança social. Não senhor. Somos também isso. Mas não podemos perder aquilo que movia Pai Américo. Sermos uma instituição de sabor evangélico, empenhada na construção do Reino - como realização da Grande Utopia do(s) Filho(s) do(s) Homem(ns), protagonizada pelo Nazareno, filho do carpinteiro... (Mt 13,55). Uma instituição onde os últimos são os primeiros. Sem riscos de "cair na vulgaridade das obras semelhantes"...
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1 - Penso que todos eles intuem que "viver é colher o seu próprio cacho de oportunidades na vinha da aventura!"... A alma (que "é sempre perfeita") sabe desenvencilhar-se mesmo num corpo imperfeito...
2 - Alusão ao último livro de Jean Vanier, sobre as pessoas com deficiência - Verdadeiramente Humanos.
Um admirador