BEIRE

Flashs da Quinzena…

1. Um livro, uma oliveira, e uma... - Acho que devíamos fazer alguma coisa. São 94, Abel! Não sabemos o que virá a seguir... Foi assim que, ao telefone, o nosso Henrique me falou. Era o traduzir dos seus sentimentos de filho (quase físico, diz ele no livro), amigo, grato pelo apoio recebido em horas decisivas, devotado cuidador, empenhado em que "nenhum gosto de ti fique por dizer" a P.e Telmo. Porque, sem P.e Telmo, o nosso Henrique nunca seria o Henrique Manuel da Rádio Renascença, o sr. Prof. Dr. Henrique Manuel Pereira - orgulho da Universidade Católica, Porto. Faltavam poucas semanas para o 25 de Novembro - aniversário natalício de P.e Telmo.

Continua a conversa: - Gostava que se fizesse alguma coisa. Esperava que o último livro dele - O Silêncio de Deus - já estivesse pronto, mas a tipografia... O Abel que acha? - Eu estou contigo, Henrique. Não lhe sou tanto como tu, mas sabes que estou aqui muito por ele. É um dos grandes pilares da Obra da Rua. E de mim mesmo. Do que eu puder, podes contar comigo.

Depois, num de repente, o WhatsApp surpreende-me com um "Dr. Henrique Manuel criou o grupo 'Lançamento Livro_1'. E aparece quase uma lista telefónica a convidar para a homenagem a prestar aos 94 anos de P.e Telmo. Chovem os SINS e as desculpas dos NÃOS porque assim à última hora...

A festa aconteceu. No Auditório Carvalho Guerra, da Católica. Uma "conversa de sofá", com uma sala cheia. Para nos deliciarmos com aquelas "conversas" e dar graças por esta vida tão fecunda. Em pouco mais de oito dias, o Prof. Dr. Luís Amaral, da Estatal, ruminou o livro e preparou-se para nos brindar a todos com uma apresentação original e brilhante. Homem culto, de coração inteligente e inteligência sensível (I Rs 3,9), voluntário à prova de bala aqui no Calvário, o nosso Luís (a partir do livro) mostrou-nos um bonito retrato por dentro d'um pai e d'um filho que tínhamos ali diante de nós - P.e Telmo e Henrique Manuel. Que bonito foi aquilo. Quase me apetece pedir que brindem os nossos leitores com um bocadinho das nossas delícias durante as duas horas que ali passamos.

Já no final, inesperadamente, irrompe, em direcção ao sofá, um grupo com uma viçosa oliveira, envasada e enfeitada com requinte, para oferecer a P.e Telmo. Comovido e agradecido, prometeu ali, alto e bom som: - Amanhã vou plantá-la no Calvário. E, mostrando-a para todos: - Olhem! Bonita como o sol!

Ela ali está à entrada do nosso Calvário. Um sacramento. A falar de força, de longevidade, de transcendências. A falar dessa luz/Luz que, nesta hora, o Calvário tanto necessita.

2. Na dor de um NÃO podemos... Não sei muito da história delas. O que sei basta-me para sentir bem fundo a dor de cada uma. Porque já muito nossas.

Encontrei-as aqui em Beire, vai para cinco anos. Religiosamente, vinham um domingo por mês fazer o almoço para os rapazes. Sempre traziam quase tudo preparado de casa. Para ser ultimado aqui, na cozinha lá de baixo. Onde, então, os rapazes eram. Comidinha rica, preparada por mãos pobres - quase tudo a expensas suas. Todos estávamos sempre à espera d'aquela comidinha!... Era de lamber a beiça.

Não são, mas parecem mesmo mãe e filha. No dar-se a mão e, juntinhas, no dar(-se) aos outros. O peso dos anos, um certo apego a P.e Baptista na sua obra e, mais que tudo, a nova situação d'O Calvário, levou a que as duas se afastassem.

Curada a ferida, começam a aparecer-nos na missa de domingo - para matar saudades; porque eles já são como da nossa família. Agora, a mais velha (já nos 87) está no Hospital. Soube-o lá, quando às voltas com o Nána. Era a mais nova, a visitar / cuidar da mais velha. - Parece que foi uma trombose. Ficou incapacitada de todo para se bastar a si mesma.

Hoje o Pomba bate-me ao ferrolho. - Está ali F... que pede para falar consigo. Vou. Expõe-me o problema. Desesperada. - O Hospital já não tem mais nada a fazer; na pp 6ª feira quiseram mandá-la para casa, mas ela não pode andar, muito menos subir escadas e não tem ninguém. Já bati a todas as portas. As assistentes sociais não fazem nada. Apanho sempre com o 'vá falar a e a e a'... Trabalho. Assim, não posso tomar conta dela. Não sei mais onde bater. Se m'a mandam para Murça - cuidados continuados - assim sozinha, sem o carinho de ninguém, ela morre-nos.

Puxo a fita atrás. Esta nossa irmã - agora doente - foi a mãe da casa em Paço de Sousa; foi voluntária dedicada aqui no Calvário. Deu a vida pelos que dela precisaram. Agora, é ela que precisa. Na "assistência" do Estado/Lei: - Não temos verba nem pessoal para atender estes casos. (Falam os "letrados, escribas e fariseus"). No Calvário: - Ainda não podemos, porque está em curso o processo de... São as obras exigidas por lei - para os licenciamentos que nos permitam...

Entretanto, o Evangelho grita-me cá dentro - faz o que gostarias que... (Mt 7, 7-12). S. Paulo fala-me de prioridade aos domésticos na fé. Não posso ignorar. É a minha dor. É o meu direito/dever à indignação. Sem evasivas nem lugar para mitos de omni-impotência...

Um admirador